A aplicação da epidemiologia clínica à psiquiatria, uma matéria da qual esta última cada vez mais se aproxima, revelou uma condição sindrômica suficientemente conspícua para ser considerado um paradigma na disciplina de psiquiatria e saúde mental. Trata-se da existência de uma alta prevalência de patologias psiquiátricas, isto é, doenças mentais, em paralelo à dependência química, que chega a atingir quase dois terços das coortes. Tão significativa é esta associação que ela passa a se comportar epidemiologicamente como uma entidade clínica, e por isso foi denominada “patologia dual”. A designação nasceu do fato de existirem, concomitantemente no mesmo doente, um diagnóstico de patologia de dependência química e uma patologia psiquiátrica aditiva.

Isto, contudo, não se limita apenas a uma associação estatística. A condição interfere no tratamento e conduta tradicionais da psiquiatria em relação ao doente mental, pois a abordagem de uma ou outra condição não é suficiente para tratamento responsivo. Em outras plavras, se tratado para uma ou outra condição a resposta não é satisfatória para nenhuma delas. Então exige-se uma abordagem que considere ambas as patologias como parte de um mesmo cluster.

Alguns aspectos genéticos são evidenciados nesta questão. Somente 10%, em média, dos que fazem uso ou abuso de substâncias, desenvolvem adição ou dependência, sugerindo uma diátese genética. Por outro lado, a alta prevalência de adição entre doentes mentais, sugere ser a patologia dual um fenótipo psicopatológico. Uma das teorias atualmente em evidência, considera que a dependência química produz alterações neurobiológicas que aumentam significativamente a vulnerabilidade do sujeito a transtornos mentais. É possível que indivíduos com baixa atividade dopaminérgica pré-frontal, anedônicos, que tendem a buscar drogas que minimizem sua apatia e disforia, sejam os alvos principais da patologia dual.

A dificuldade diagnóstica desta condição, decorre, em grande parte, do fato de os complexos sintomáticos estarem compartimentalizados diferentemente nas classificações psiquiátricas atuais (CID-10 e DSM-IV), que não levam em consideração que complexos supostamente diferentes estejam relacionados aos mesmos substratos neuronais e etiológicos. Neste sentido, a patologia dual é uma nova entidade clínica sindrômica.

Citando Néstor Szerman (presidente da Sociedade Espanhola de Patologia Dual):
“As altas taxas de prevalência de patologia dual, nos orientam a afirmar que todos os programas dirigidos a indivíduos com doença mental grave, deveriam se organizar como programas de patologia dual, já que isto é mais regra do que exceção”.
Edição de maio da Psychiatry onde line Brasil.

Aluno Alexandre Andrade, CJJ.

Patologia Dual: um novo diagnóstico