Aluna:Maria Aparecida Xavier Vieira

Introdução
O comportamento anti-social de crianças e adolescentes tem sido atribuído a fatores constitucionais e ambientais. Historicamente, foi com o estabelecimento de clínicas vinculadas ao juizado de menores que profissionais de saúde mental puderam observar o desenvolvimento do comportamento anti-social na infância e adolescência. Ao constatar-se a grande freqüência de problemas familiares e sociais na história de vida dos delinqüentes juvenis, formulou-se a hipótese de uma reação às adversidades encontradas tanto no ambiente familiar como na comunidade.

Segundo Winnicott, quando crianças sofrem privação afetiva, manifestam-se os comportamentos anti-sociais no lar ou numa esfera mais ampla. Do ponto de vista psicodinâmico, estes comportamentos demonstram esperança em obter algo bom que foi perdido, sendo a ausência de esperança a característica básica da criança que sofreu privação. O jovem experimenta um impulso de busca do objeto, de alguém que possa encarregar-se de cuidar dele, esperando poder confiar num ambiente estável, capaz de suportar a tensão resultante do comportamento impulsivo. O ambiente é repetidamente testado em sua capacidade para suportar a agressão, tolerar o incômodo, impedir a destruição, preservando o objeto que é procurado e encontrado.

São fatores associados a comportamento anti-social na infância: ser do sexo masculino, receber cuidados maternos e paternos inadequados, viver em meio à discórdia conjugal, ser criado por pais agressivos e violentos, ter mãe com problemas de saúde mental, residir em áreas urbanas e ter nível socioeconômico baixo.

Alguns autores referem que a baixa renda associada ao comportamento anti-social da criança está relacionada à personalidade anti-social materna e à negligência por parte dos pais. De fato, pode-se supor que mães anti-sociais teriam maior dificuldade para atingir níveis de renda mais elevados, pois não manter-se-riam no emprego e teriam menor condição de manter um relacionamento estável com um marido ou companheiro que contribuísse com a renda familiar. Pais anti-sociais também são freqüentemente irresponsáveis e negligentes com seus filhos, deixando de alimentá-los adequadamente ou levá-los ao médico quando doentes. Além disso, adolescentes vivendo na pobreza e pouco valorizados pelos pais podem buscar reconhecimento pessoal e ascensão econômica através de atividades delinqüenciais grupais.

Quanto à discórdia conjugal e a problemas mentais maternos, Shaw e Emery  demonstraram que o conflito entre os pais e a depressão materna estavam associados a comportamentos agressivos e anti-sociais em escolares. No entanto, é preciso considerar a contribuição da criança para a qualidade do relacionamento entre pais e filhos, pois crianças difíceis de lidar, desobedientes e agressivas favorecem a desorganização do ambiente familiar e o desequilíbrio de um relacionamento conjugal mais frágil.

Quanto ao ambiente familiar agressivo e violento, não se pode deixar de mencionar a influência da violência doméstica e do abuso físico sobre o comportamento anti-social na infância. Taxa elevada de comportamento anti-social (21%) foi observada em filhos (idade escolar) de mulheres espancadas.Em Khartoum, Sudão, crianças submetidas à punição corporal grave (corda ou vara) apresentaram mais problemas de comportamento (40,2%) que crianças punidas somente com palmadas (24,6%).Estudos que avaliaram os efeitos do abuso físico a longo prazo demonstraram que indivíduos que sofreram abuso ou negligência na infância tiveram maior probabilidade de cometer crimes.No entanto, a grande maioria das crianças que sofreram abuso (74%) ou negligência (90%) não se tornaram delinqüentes, nem cometeram crimes violentos.

Fatores genéticos e neurofisiológicos também podem estar envolvidos no desenvolvimento do comportamento anti-social.Mednik et al relataram maior taxa de criminalidade nos pais biológicos que nos pais adotivos de indivíduos com antecedentes criminais, formulando a hipótese de uma predisposição biológica para o comportamento anti-social. A influência genética é mais evidente nos casos acompanhados de hiperatividade e pode ser responsável pela maior vulnerabilidade do indivíduo aos eventos de vida e ao estresse. No entanto, o papel dos fatores genéticos no transtorno da conduta ainda precisa ser melhor esclarecido.

Finalmente, há indícios de diferenças nos fatores de risco para o comportamento anti-social segundo o sexo do indivíduo.Em levantamento populacional realizado no Canadá, envolvendo 1.651 indivíduos com 16 a 24 anos, verificou-se que além da presença de comportamentos anti-sociais antes dos 15 anos, outros fatores foram considerados de risco para comportamento anti-social na adolescência e início da vida adulta. Para os homens, foi fator de risco o fato de ter convivido na infância com pais com problemas de saúde mental (depressão, mania, episódios psicóticos), enquanto para as mulheres, destacaram-se o abuso sexual na infância e o fato de ter sido criada por pais com comportamento anti-social ou abuso de álcool/drogas.
Referência:
1. Loeber R, Dishion T. Early predictors of male delinquency: a review. Psychol Bull 1983;94:68-99.

2. Winnicott DW. Privação e delinqüência. São Paulo: Martins Fontes; 1994.

3. Offord DR. Conduct disorder: risk factors and prevention. In: Shaffer D, Philips I, Enzer NB, editors. Prevention of mental disorders, alcohol and other drug use. Rockville (MD): U.S. Department of Health and Human Services; 1989. p. 273-307.

4. Shaw DS, Emery RE. Chronic family adversity and school-age children’s adjustment. J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1988;27(2):200-6.

5. Loeber R. Development and risk factors of juvenile antisocial behavior and delinquency. Clin Psychol Rev 1990;10:1-41.

6. Frick PJ, Lahey BB, Hartdagen S, Hynd GW. Conduct problems in boys: relations to maternal personality, marital satisfaction, and socioeconomic status. J Clin Child Psychol 1989;18(2):114-20.

7. Lahey BB, Russo MF, Walker JL, Piacentini JC. Personality characteristics of the mothers of children with disruptive behavior disorders. J Consult Clin Psychol 1989;57(4):512-5.

8. Kolvin FJ, Miller JW, Fleeting M, Kolvin PA. Social and parenting factors affecting criminal-offence rates: findings from the Newcastle thousand family study (1947-1980). Br J Psychiatry 1988;152:80-90.

9. Anolik SA. Family influences upon delinquency: biosocial and psychosocial perspectives. Adolescence 1983;18(71):489-98.

10. Earls F. Oppositional-defiant and conduct disorders. In: Rutter M, Taylor E, Hersov LA, editors. Child and adolescent psychiatry: modern approaches. Oxford: Blackwell Scientific Publications; 1994. p. 308-29.

11. Wildin SR, Williamson WD, Wilson GS. Children of battered women: developmental and learning profiles. Clin Pediatr 1991;30(5):299-304.

12. Rahim SIA, Cederblad M. Effects of rapid urbanization on child behavior and health in a part of Khartoum, Sudan: II-Psychosocial influences on behaviour. Soc Sci Med 1986;22(7):723-30.

13. Lamphear VS. The impact of maltreatment on children’s psychosocial adjustment: a review of the research. Child Abuse Negl 1989;9:251-63.
14. Widom CS. The cycle of violence. Science 1989;244:160-6.

15. Mednick SA, Moffit TE, Pollock V, Talovic S, Gabvielli W. The inheritance of human deviance. In: Olweus D, Yarrow MR, editors. Development of antisocial and prosocial behavior. New York: Academic Press; 1986.

16. Rutter M, Giller H, Hagell A, editors. Antisocial behavior by young people Cambridge: Cambridge University Press; 1998.

17. Bordin IAS.Fatores de risco para comportamento anti-social na adolescência e início da vida adulta [dissertação de tese de doutorado]. São Paulo (SP): Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina; 1996.

Comportamento Anti-Social