Clínica Jorge Jaber, 15/03/2005
Objetivo: Esse trabalho visa discutir as estratégias de tratamento da pedofilia, a partir da descrição de um caso clínico com evolução satisfatória.
Método: Relato de caso: homem caucasiano de 70 anos, professor universitário aposentado, casado, três filhos adultos. História de Transtorno Bipolar diagnosticado há 43 anos, recebendo tratamento desde então. Diagnóstico de hipotiroidismo primário há 10 anos, hipertensão arterial sistêmica, insuficiência coronariana, tratados adequadamente. Quadro de pedofilia iniciado há 32 anos, caracterizado principalmente por exposição de órgãos sexuais, carinhos, toques, colocar crianças no colo para contato íntimo. Internado por impossibilidade de controle de impulso, em julho de 2002, de início sob vigilância constante. Exibia humor deprimido, baixa tolerância à frustração, hostilidade, retardo motor e retração social. Modelo psicoterápico incluiu terapia individual e de grupo, com base em programa de 12 Passos adaptado a sua condição e em abordagem cognitivo-comportamental; terapia familiar; e medicamentosa: lorazepam 1mg 2x/d, venlafaxina 150mg/d, lítio 300mg 2x/d, além de verapamil, nitroglicerina, enalapril, atenolol, e tiroxina 25ug.
Resultados: Evolução inicial com variável resistência às atividades propostas. Relutância em discutir sua compulsão e inadequação social-familiar, limitando-se a falar de seu quadro depressivo. Gradualmente demonstra confiança aparente na equipe, discutindo episódios de pedofilia e exibicionismo, porém, recebendo mal comentários e críticas – por vezes hostis – de seus companheiros de grupo, manifestando raiva e autopiedade. Após três meses de internação, foi transferido para instalações abertas, por melhor aceitação das normas comportamentais – trocar de roupas de porta fechada, evitar isolamento e comparecer às atividades propostas. Família demonstrou resistência a aderir ao tratamento familiar proposto, com filhos alegando domicílio fora da cidade e esposa evitando contato sistemático com o paciente (visitas mensais apenas acompanhada de um dos filhos). Após um ano de internação, paciente exibia humor ainda oscilante, porém, capaz de maior aceitação de responsabilidade e adesão ao plano terapêutico, desenvolvendo visão espiritual em relação a sua recuperação. Transferido por decisão familiar (questões econômicas) para outra instituição, mantém-se (junho de 2004) em remissão dos sintomas depressivos e sem expressão de comportamento pedofílico, sempre em ambiente controlado.
Conclusão: O presente caso atesta as complexas relações entre distúrbios do humor e do controle do impulso sexual. Controle ambiental e abordagem multidisciplinar, incluindo tratamento medicamentoso e abordagem psicoterápica mista, foi capaz de controlar as variadas manifestações psicopatológicas ao longo de dois anos.
SANTOS, Simone, JABER FILHO, Jorge A., JULLIEN, Carlos, ANDRÉ, Charles. Pedofilia e Transtorno Bipolar – Relato de Caso Clínico com Evolução Satisfatória Após Abordagem Multidisciplinar em Ambientes Controlados. Rio de Janeiro: APERJ, Arquivos Brasileiros de Psiquiatria, Neurologia e Medicina Legal – Vol 98, Nº 02, ABR/MAI/JUN 2004, p.32.