A Entrevista motivacional foi desenvolvida na década de 80 com o objetivo da modificação dos comportamentos de risco de usuários de álcool . É um estilo de conversa colaborativa voltado para o fortalecimento da sua própria motivação e comprometimento com uma mudança. Por se tratar de uma abordagem que tem uma meta específica, que é resolver a ambivalência, é compreendida com caráter de intervenção breve, podendo assim, ser utilizada por uma ampla gama de profissionais em diferentes serviços.
As premissas básicas que auxiliam o profissional na prática da EM são empatia, congruência, espírito colaborativo no aumento da motivação para a mudança; adoção de um estilo calmo e eliciador; considerar a ambivalência natural (a motivação para a mudança deve ser eliciada no cliente e não imposta); a resistência pode ser reduzida ou aumentada através das interações interpessoais (o profissional é diretivo em auxiliar o cliente a examinar e resolver a ambivalência); o relacionamento cliente-profissional deve ser colaborativo e amigável; clientes são responsáveis pelo seu progresso (o profissional atua como um facilitador no processo, estimulando e apoiando a autoeficácia do cliente); a abstinência é a meta mais segura, mas nem sempre a melhor escolha, principalmente com clientes em pré-contemplação ou contemplação.
A Entrevista Motivacional possui um estilo colaborativo, que compõe-se de quatro elementos:
1. Parceria: A EM é feita “com” e não “para” a pessoa. rata-se de um elemento que reforça a necessidade do terapeuta interagir e se interessar pela história e evolução do cliente e não se ater a uma conduta prescritiva.
2. Aceitação:propõe que o profissional se interesse e valorize o potencial de cada indivíduo. Aceitar a pessoa não significa necessariamente que o profissional aprova ou endossa o status quo ou as ações do cliente, ou seja, se o profissional aprova ou reprova é irrelevante. A aceitação consiste no reconhecimento absoluto, na empatia acurada, no suporte à autonomia do cliente e no reforçamento positivo de falas, e posturas em prol da saúde e integridade de vida do cliente.
3. Evocação: Evocar as forças que motivam a pessoa, ao invés de persuadir. Evocar quer dizer lembrar, recordar. Motivação vem de motivo, que quer dizer aquilo que pode fazer mover, motor que causa ou determina alguma coisa. A motivação é um recurso interno. A evocação traz a proposta de ajudar o cliente a se recordar de elementos próprios e únicos que podem se tornar motivos para que haja uma mudança de comportamento.
4. Compaixão: Promover ativamente o bem-estar do outro, priorizando suas necessidades. meio de tentar fazer o profissional se aproximar mais verdadeiramente da pessoa e não do problema dela. Uma vez que o profissional consegue ter acesso à unicidade de cada um, torna-se possível uma melhor compreensão das complexidades individuais que dificultam as mudanças de comportamento. É um ato de aproximar-se para verdadeiramente ajudar.
São processos da Entrevista Motivacional:
Engajamento: consiste na construção de uma aliança terapêutica. Quando o profissional consegue estabelecer uma boa aliança terapêutica com o cliente, há mais engajamento no tratamento, possibilitando que haja uma maior adesão ao mesmo.
Foco: a construção do foco está no desenvolvimento e manutenção da direção específica da conversa para a mudança. O cliente durante o atendimento pode estar muitas vezes envolto em uma série de acontecimentos e sua tendência pode ser a de se concentrar nos sintomas ou nos fatos mais recentes que o levaram até ali, subvalorizando ou até mesmo desconhecendo o fator “causa”.
Evocação: evocar consiste no movimento do profissional de extrair da pessoa os próprios sentimentos concernentes ao propósito de mudança. Esta é a essência da EM. Todas as conclusões ou caminhos a serem percorridos, devem ser uma conclusão que o cliente alcança sozinho, com o auxílio do profissional e não com a sua indução.
Planejamento: o planejamento está na construção do movimento de “quando” e “como” mudar. Tomando-se como base os estágios de prontidão para a mudança, há um momento em que o cliente diminui os seus questionamentos e começa a se preparar para uma tomada de atitude. Neste momento, o planejamento é fundamental, uma vez que desenvolve a formulação de um plano de ação específico, podendo encorajar o cliente a aumentar seu compromisso com a mudança.
A EM foi desenhada para ser uma intervenção breve em intensidade e duração. É mais vantajosa quando aplicada em ambientes com grande demanda de atendimento e pouca disponibilidade de tempo e profissionais.
A EM tem se mostrado uma intervenção efetiva para reduzir o consumo do álcool e aumentar a motivação para a mudança do padrão de beber, bem como aumentar a procura e a adesão de usuários de álcool a um tratamento formal e especializado para a dependência alcoólica. É uma intervenção de baixo custo e facilmente aplicável em qualquer ambiente de saúde ou na comunidade. Por outro lado, outros estudos apontam que a integração da EM com outras abordagens como, por exemplo a um TCC, vem sendo evidenciada tanto nos estudos, quanto na prática clínica. Pacientes graves, ou com danos cognitivos significativos, podem não responder bem à EM pura; contudo, ainda assim espera-se que o profissional tenha uma postura motivacional, aliada a intervenções mais diretivas e comportamentais.
FIGLIE, Neliana Buzi; GUIMARAES, Lívia Pires. A Entrevista Motivacional: conversas sobre mudança. Bol. – Acad. Paul. Psicol., São Paulo , v. 34, n. 87, p. 472-489, dez. 2014 .