Aluna: Simone Gisele Fina – 15/10/2018
ÍNDICE
Resumo ……………………………………….. 2
Introdução …………………………………….. 3
Mindfulness ………………………………….. 4
Exercitando Mildfulness ……………………. 7
Aceitação ……………………………………… 9
Validação ……………………………………. 11
Aceitação e Validação de Mãos Dadas ……..15
Conclusão ……………………………………. 16
Bibliografia ………………………………….. 17
RESUMO
O presente artigo aborda um conceito com origem nas práticas meditativas orientais, que passou a fazer parte da medicina comportamental a partir dos programas de redução de estresse de Kabat-Zinn. Mindfulness é definida como uma forma específica de atenção plena – concentração no momento atual, intencional, e sem julgamento. Significa estar plenamente em contato com a vivência do momento, sem estar absorvido por ela. Só durante a década passada ganhou destaque nas literaturas comportamentais e cognitivas, enquanto anteriormente estava implicitamente presente nas práticas clínicas destas tradições. O artigo apresenta mindfulness da forma em que é praticada em diferentes terapias contemporâneas. Discute-se ainda, as possibilidades terapêuticas que este conceito traz a partir de diferentes perspectivas teóricas como também traz uma reflexão sobre os termos aceitação, validação e mindfulness e sobre como seu uso na literatura da terapia cognitivo-comportamental contemporânea esclarece alguns processos importantes na terapia. Esclarecendo diferenças entre idéias estabelecidas e novas, esses termos ampliam a liberdade de escolhas terapêuticas. Colocá-los em oposição aos mais tradicionais na literatura traz um sentimento de descontinuidade na teoria cognitivo-comportamental, mas ajuda a enxergar de forma mais clara o leque de possibilidades para o desenvolvimento da teoria e da prática. Finalmente, o conceito de mindfulness é exposto, para mostrar como pode subsidiar a validação e promover a aceitação. Há um crescente interesse em temas que apresentam interfaces entre espiritualidade e saúde, entre psicologia e religião. Alguns estudos têm abordado essas aproximações tanto na perspectiva dos clientes como dos terapeutas religiosos/espirituais, ou ainda no que se refere às intervenções.
Uma técnica que tem se destacado nas intervenções da terapia cognitivo-comportamental é o mindfulness, advinda do budismo.
Palavras-chave: Aceitação, Mindfulness, Validação, Terapia Cognitivo-Comportamental, Terapia Dialética Comportamental
INTRODUÇÃO
A prática de mindfulness passou a fazer parte da medicina comportamental a partir dos programas de redução de estresse de Kabat-Zinn (1982). O conceito, cuja origem está nas práticas orientais de meditação (Hanh, 1976), despertou, logo no início dos anos de 90, o interesse de clínicos fora da área da medicina comportamental. Tomou de assalto as terapias comportamentais contextualistas, que já tinham afirmado sua identidade durante a década anterior (Zettle & Hayes, 1986; Kohlenberg & Tsai, 1987; Linehan, 1987) e se estabeleceu como uma característica central destas (Hayes, 2004). Kabat-Zinn (1990) define mindfulness como uma forma específica de atenção plena – concentração no momento atual, intencional, e sem julgamento. Concentrar-se no momento atual significa estar em contato com o presente e não estar envolvido com lembranças ou com pensamentos sobre o futuro. Considerando que as pessoas funcionam muito num modo que o autor chama de piloto automático, a intenção da prática de mindfulness seria exatamente trazer a atenção plena para a ação no momento atual. ‘Intencional’ significa que o praticante de mindfulness faz a escolha de estar plenamente atento e se esforça para alcançar esta meta. Está em contradição com a tendência geral das pessoas de estarem desatentas, ou de se perderem em julgamentos e reflexões que as alienam do mundo que as cerca. Para estar com atenção concentrada no momento atual, os conteúdos dos pensamentos e dos sentimentos são vivenciados na maneira em que se apresentam. Eles não são categorizados como positivos ou negativos. ‘Sem julgar’ significa que o praticante aceita todos os sentimentos, pensamentos e sensações como legítimos. A atitude de não julgar está em contraste com a tendência automática das pessoas de investirem na luta contra vivências aversivas, deixando de viver o resto da sua realidade. O praticante não trata de forma diferenciada, determinados sentimentos (por exemplo, raiva contra uma pessoa admirada ou medo de algum aspecto de si mesmo), pensamentos (como idéias imorais) ou sensações (por exemplo, dor na ausência de uma lesão ou diagnóstico que a justifiquem). São suspensas as racionalizações pelas quais as pessoas costumam truncar suas percepções de eventos inquietantes para encaixá-los nas suas opiniões preconcebidas.
MINDFULNESS
Aluna: Simone Gisele Fina – 15/10/2018
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Uma idéia central na literatura sobre mindfulness é que viver sob o comando do piloto automático não permite à pessoa lidar de maneira flexível com os eventos do momento. Confiar no piloto automático promove modos rígidos e altamente limitados de reagir ao ambiente. Na vida urbana moderna, agimos muitas vezes sem estar emocionalmente envolvidos em nossas ações, ou fazemos várias coisas ao mesmo tempo, às vezes sem percebermos que as diferentes atividades têm diferentes objetivos e atrapalham entre si. Assim, podemos agir rápido e nos projetar como eficientes e produtivos. Em outros casos, permitimo-nos ficar tão emaranhados em nossos pensamentos e sentimentos sobre passado ou futuro, ou em nossas racionalizações sobre a nossa vivência, que perdemos contato com o que está acontecendo no momento atual (Hayes, 2004; Linehan, 1993; Kabat-Zinn, 1990). Muitas vezes vivemos desta forma porque o contato com certos aspectos importantes do nosso cotidiano é doloroso. Evitamos pensamentos, sentimentos e situações que nos deixam tristes, inseguros ou envergonhados ou porque achamos que não agüentaríamos. Esta esquiva experiencial, ou esquiva da vivência emocional, foi descrita por Hayes (1999) como a tentativa de não ter determinados sentimentos, pensamentos, memórias, ou estados físicos, por estes serem avaliados negativamente. Trata-se de uma estratégia adaptativa e socialmente aprovada que ocorre quando eventos privados passam a ser alvos de controle verbal. Esta estratégia visa a promover um ‘sentir-se bem’ com a ênfase em ‘bem’, mas isto ocorre ao custo da capacidade de ‘sentir-se bem’ com ênfase no ‘sentir-se’. A pessoa acaba evitando em curto prazo ‘sentir-se mal’, mas perde o contato com aspectos aversivos (porém importantes) da sua vivência (Hayes, Pankey & Gregg, 2002). Uma falha importante desta estratégia adaptativa é que a pessoa procura excluir sensações e sentimentos negativos, enquanto que estes não são danosos em si, mas sim sinais de condições de vida que deveriam ser enfrentados. Outra falha é que muitas vezes a recusa de vivenciar essas sensações e sentimentos os torna mais insistentes. Quanto mais a pessoa tenta não tê-los, mais os terá (Hayes, 1987; Hayes, Pankey & Gregg, 2002). MILDFULNESS Foi a partir da aproximação das ciências médicas e psicológicas com a religião que surgiu uma técnica muito discutida atualmente: o mindfulness. Jon Kabat-Zinn, aproveitando-se de um ambiente mais aberto a essas ideias, incorporou algumas práticas budistas (principalmente da meditação) à medicina comportamental em seus trabalhos que visavam à redução de estresse e manejo de dores crônicas. Assim, no grupo desenvolvido por ele, em um programa de gestão de estresse baseado em mindfulness, o pesquisador começou a desenvolver a capacidade dessa atenção plena nos pacientes. Especificamente, o mindfulness refere-se à capacidade de prestar atenção no momento presente e a tudo que surge internamente ou externamente, sem a realização de julgamentos ou o desejo de que as coisas sejam diferentes (Vandenberghe & Assunção, 2009). Assim, quando o mindfulness ocorre, o indivíduo tem uma consciência sincera, intencional, ao que está acontecendo de momento a momento, sem julgar, na vivência enquanto ela ocorre. Pode-se dizer, então, que mindfulness é a habilidade de estar consciente dos seus pensamentos, emoções, sensações e ações, no momento presente sem julgar ou criticar a si mesmo ou a própria experiência. É “estar no aqui e agora”. Atualmente, a literatura tem investigado esta técnica em diversos tratamentos e para diferentes transtornos. Hardt et al. (2011) mostram que há evidência do mindfulness ligado à saúde física e mental, estando associado a um menor índice de estresse e distúrbios mentais. Além disso, o aumento na capacidade de mindfulness sugere uma diminuição na angústia e no relato de sintomas médicos. Os autores levantam que vários programas têm sido desenvolvidos com o objetivo de ajudar os pacientes no tratamento de doenças crônicas, câncer e depressão. McKay et al. (2007) afirmam que as habilidades em mindfulness ajudam no foco em um elemento em um dado momento e isso pode auxiliar no melhor controle de emoções intensas, visando acalmá-las. Além disso, há argumentos de que o mindfulness ajuda na identificação e separação de julgamentos das experiências, além de agir sobre o equilíbrio entre o raciocínio dos pensamentos com as necessidades das emoções. O mindfulness é também conhecido como uma meditação envolvendo o desenvolvimento da atenção plena. Há inúmeros relatos dessa meditação e de exercícios semelhantes em diversos sistemas religiosos como cristianismo, islamismo, judaísmo, mas esta técnica é principalmente conhecida a partir dos ensinamentos budistas (Mckay et al., 2007). Atualmente, o budismo é uma das poucas religiões que ainda valoriza o desenvolvimento dessa habilidade. Ela é muito utilizada para o trabalho com as emoções e para que o praticante consiga estabelecer o foco no presente. Apesar de seu surgimento estar vinculado a um contexto religioso, o mindfulness começa a ocupar outros espaços. Iniciado com os pacientes de Kabat-Zinn, hoje a técnica já é vista em outras formas de psicoterapia, incluindo algumas terapias cognitivas. Nestas, o mindfulness é colocado como uma técnica sistematizada, que pode ser ensinada e que é treinável. Giuffra (2009) destaca que apesar do mindfulness ser considerado um componente essencial da psicologia budista e fazer parte do Caminho Óctuplo para se alcançar o nirvana, ele não deve ser considerado como um conceito religioso e nem mesmo um conceito espiritual. O autor classifica como um conceito cognitivo, usado no budismo, mas que hoje também é reconhecido e estudado pela Psicologia e que tem se destacado em abordagens como a Gestalterapia, e diferentes Terapias Cognitivo-Comportamentais, tais como a Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT), a Terapia Comportamental Dialética (TCD), Terapia Cognitiva baseada em Mindfulness (MBCT) e Programa de Redução de Estresse em Mindfulness (MBSR). Na Terapia Comportamental Dialética, o Mindfulness é relatado como uma das quatro habilidades críticas que podem ajudar na regulação emocional, ajudando o paciente a se manter equilibrado quando as emoções surgirem de forma intensa (McKay et al., 2007).
Na Terapia de aceitação e compromisso, o mindfulness é considerado um importante recurso para ajudar o paciente no processo de aceitação. A aceitação neste contexto é diferente da resignação. Refere-se a um processo ativo no qual o indivíduo admite o que acontece consigo sem se apegar aquilo que gostaria que fosse. Trata-se de compreender a realidade percebendo o aparecimento inevitável de pensamentos, sentimentos e sensações sem evitá-los, rechaçá-los ou julgá-los (Roomer & Orsillo, 2010). O mindfulness permite uma maior atenção, uma maior consciência e ao mesmo tempo permite que o indivíduo entenda sobre a impermanência daquilo que está se passando naquele momento. O pensamento, a sensação e a emoção daquele momento irão passar e por isso o mindfulness permite uma maior aceitação dos fatos, uma maior compreensão dos processos que estão acontecendo naquele momento. Obviamente, a aceitação não deve ser entendida como uma postura de conformação do indivíduo a uma determinada situação ou circunstância, mas como uma postura mais aberta e compassiva que permite a flexibilização dos pensamentos, dos comportamentos, entendendo as ocorrências da vida como partes do caminho que se deseja trilhar. Opta-se assim por estabelecer o foco no que está acontecendo sem se prender em atitudes julgadoras que normalmente são inúteis para o indivíduo. Nas terapias, as intervenções baseadas na aceitação e em mindfulness estabelecem o foco na habilidade em manter-se atento ao momento presente, e atualmente esta habilidade é apontada como um importante recurso para lidar com emoções intensas, com dores crônicas, episódios depressivos, transtornos alimentares, transtornos de personalidade borderline. Entretanto, o fato de ter sido incorporada ao contexto das Terapias cognitivo-comportamentais evidencia a tentativa de buscar relações entre a Psicologia e a Religião, neste caso, o budismo. Outras relações têm sido feitas. Giuffra (2009), buscando discutir as semelhanças entre ambas, utiliza o encontro entre Dalai Lama (14º) e Aaron Beck na abertura do V Congresso Internacional de Psicoterapia Cognitiva ocorrido em junho de 2005, na cidade de Gotemburgo, Suécia. O autor discute as origens da Terapia Cognitiva, e alguns pontos interessantes sobre o budismo, incluindo a forma como esse sistema religioso vê e lida com a mente. Entretanto, como ponto central nesse artigo estão as semelhanças levantadas no diálogo por ambos os mestres. Primeiramente, a Terapia Cognitiva e o Budismo buscam eliminar o sofrimento e gerar o bem-estar. Ambos defendem que as emoções não são resultados de eventos reais e sim uma forma de nossas mentes processá-los. Além disso, tanto os terapeutas cognitivos quanto os praticantes budistas buscam treinar a mente para melhorar a objetividade, diminuir as distorções, erradicando o sofrimento e alcançando a felicidade. Ambos valorizam a sabedoria, compaixão, entendimento, aceitação. Por fim, ambos valorizam o método científico e dão um grande valor a gerar e cultivar um estado de alerta e atenção mental. Apesar das origens do mindfulness estarem vinculadas ao budismo, hoje é possível perceber que ela tem sido considerada, no campo científico, apenas como uma intervenção que pode contribuir para melhorar o estado de alguns pacientes. Como técnica ela pode ser aprendida, desenvolvida, treinada e não precisa estar vinculada a um contexto espiritual/religioso. A busca principal (como se pode ver em Davis & Hayes, 2011; Foley et al., 2010; Hofmann et al., 2010, Ma & Teasdale, 2004), tem sido em verificar, de forma empírica, os efeitos e fundamentos dessa atenção que pode se tornar uma importante ferramenta terapêutica no futuro.
EXERCITANDO MILDFULNESS
Distanciar-se, nesse contexto, significa notar os próprios pensamentos, emoções e sensações físicas sem elaboração ou julgamento, de forma a possibilitar um esvaziamento dos conflitos e uma redução da influência que os medos têm sobre a pessoa. Consiste em aceitar que certas preocupações estão presentes e deixá-las passar, sem mexer com elas. Ao praticar, deve-se estar atento a sua atenção, pois o que importa é como focar (o processo), e não em que se focar (o conteúdo). O objeto do exercício nada mais é do que um pretexto para aprender a tomar recuo da mente sempre tagarela. Identificar-se demasiadamente com o que sentimos ou pensamos a nosso respeito gera atitudes defensivas e rígidas. Na terapia, o paciente aprende a tomar recuo de seus pensamentos e sentimentos a respeito de si, podendo observá-los e entender seu significado, mas sem acreditar neles (Hayes et al., 2012). Não se procura reestruturar o que a pessoa pensa sobre si, mas ajudá-la a se reconhecer como espectadora de seus conteúdos e conflitos. O recuo psicológico propiciado pela observação do próprio ato de observar seus conteúdos psicológicos permite enxergar o lugar deles na paisagem mais ampla. A pessoa torna-se, portanto, mais capaz de agir de acordo com suas escolhas e seus valores, e não sob o controle de suas angústias, conflitos e/ou emoções (Hayes et al., 2012). Atividades cotidianas, como escovar os dentes, atender ao telefone, fazer limpeza ou fazer anotações, podem ser aproveitadas como oportunidades de treinar a atenção plena, pois a pessoa se concentra em observar cores, texturas, cheiros e movimentos envolvidos nas atividades. O terapeuta convida o paciente a observar sucessivamente suas sensações corporais (S), a produção de seu intelecto (I) e sua percepção do mundo externo (M). Na primeira fase, o paciente presta atenção ao seu corpo. Aplica-se a aceitar tanto as sensações desagradáveis quanto as agradáveis. Na segunda fase, atenta-se aos pensamentos, às imagens, às lembranças e às avaliações. O cliente nota quando está evitando certo conteúdo ou se agarrando a outro, e percebe que certos pensamentos ou avaliações são como anzóis e, ao mordê-las, ficaria preso nelas. Porém, nota-se também que, quando não morde a isca, o anzol não o prejudica. Na terceira fase, o cliente percebe o que ocorre a seu redor. Quando está com os olhos abertos, cores, contornos ou outros aspectos da visão fazem parte do material do mundo observado. Fazendo o exercício de olhos fechados, a informação vem principalmente em forma de ruídos e cheiros. A pessoa presta atenção nas variações sutis do barulho, distingue o mundo externo de suas atividades interiores e aprende a deixar mais clara a distinção entre a realidade externa e os produtos da mente sempre tagarela: julgamentos, associações e elaborações racionais. Finalmente, quando o cliente relata sua vivência do exercício, o terapeuta verifica se ele está em contato com seu Eu-como-Perspectiva, fazendo uma pergunta simples, como “Você está observando quem está fazendo todas essas observações?” ou “Você percebe que é você que está fazendo tal ou tal distinção?”, e deixa um tempo para essa realização (Schoendorff et al., 2011). Intervenções mais simples podem ser igualmente válidas.
Quando um terapeuta sugere ao paciente, no início da sessão, que ele tire uns minutos para prestar atenção à respiração, ele faz mais que simplesmente induzir o relaxamento. Dessa forma, ele convida o cliente a conectar-se com sua vivência interior, de interromper a elaboração intelectual e o julgamento dos conteúdos e de olhar para dentro de si com curiosidade. Ao perguntar, posteriormente, o que o paciente notou e sentiu, espera-se que ele esteja em melhores condições de relatar sua vivência interior e mais capaz de distingui-la de suas elaborações e interpretações a respeito dela. Assim, um breve exercício pode trazer um pouco mais mindfulness para a sessão. Na DBT, mindfulness é entendida como uma conexão com a mente sábia que integra e transcende a emoção e a razão. A mente sábia é a sabedoria que resulta da sedimentação da história da pessoa, e é altamente intuitiva, direcionada pelos valores profundos e por uma visão ampla e contextualizada da experiência vivida. De acordo com Linehan (1993), a mente sábia supera as falhas inerentes em outras formas de funcionar, como seguir as emoções ou a elaboração racional. A mente emocional é um modo de ação impulsiva, gerida pelo que sentimos, e é genuína e intuitiva, mas instável, e entrega a pessoa à fragmentação da sua vivência. A mente racional refere-se à análise objetiva e à ação sob o controle do pensamento lógico, garante a racionalidade, mas é fria, calculista e potencialmente alienadora. Quando a mente emocional está ativada, nota-se a intensidade da emoção e sua variação, dependendo das circunstâncias. A mente sábia, por sua vez, é estável e holística. O que parece ser verdadeiro ou certo no calor da emoção refere-se à mente emocional. Se a pessoa desacelera e permite que esse calor passe, abre-se a porta para entrar em contato com a mente sábia, o que permite agir em consonância com seus valores mesmo quando sua vida ou as circunstâncias estão realmente difíceis, possibilitando abraçar cada momento como é, e não como gostaria ou temeria que fosse. Para entrar em contato com a mente sábia, a pessoa precisa aprender a observar os eventos dos quais participa, suas emoções e seus comportamentos, colocar em palavras as coisas que observa, deixando de lado suas avaliações e racionalizações, e participar do presente, envolvendo-se com atenção ao que está ocorrendo. E como fazer isso? Sem privilegiar ou rejeitar qualquer observação por ela ser agradável ou desagradável, fazendo uma coisa de cada vez, com qualidade e concentração, de forma pragmática, atento ao que funciona. Dessa forma, mindfulness não é mais uma disciplina, mas uma maneira de estar plenamente presente na vida. O conceito de mindfulness foi introduzido mais tarde na IBCT e conceituado como estar plenamente consciente do contexto das interações com o parceiro e dos alvos e valores relevantes para o relacionamento, sem fazer julgamentos, procurando validar o que o parceiro traz para a interação (Fruzetti & Iverson, 2004). De acordo com os autores, as habilidades que os cônjuges devem aprender para aceder à mindfulness em situações de conflito são: (1) escutar o parceiro com atenção sem permitir que as próprias emoções ou pensamentos contaminem a escuta; (2) prestar atenção ao que está acontecendo com o parceiro; (3) resumir a perspectiva do parceiro e refleti-la; (4) permitir-se ser vulnerável quando o parceiro é; e (5) demonstrar que aceitou o que o outro revelou de si.
Quando o terapeuta pede a uma paciente que simplesmente ouça o parceiro, sem considerar o que ela trouxe de sentimentos e preocupações para a sessão, ele já está iniciando um exercício de mindfulness. O terapeuta deve acompanhar todos os passos enquanto o casal aprende a ser mindful nas suas discussões e o processo inteiro deve se tornar uma habilidade recíproca do casal, que pode ser usada quando novos conflitos aparecem (Fruzetti & Iverson, 2004). Aqui, novamente, como no caso da aceitação e da validação, o processo é tanto um ingrediente da intervenção terapêutica quanto uma habilidade a ser ensinada ao paciente para uso no dia a dia.
ACEITAÇÃO
Dependendo da abordagem, o objeto da aceitação pode ser interno ou externo e pode tratar-se dos próprios sentimentos ou da forma de ser do outro. Na ACT, a aceitação enfoca principalmente o relacionamento da pessoa com sua vivência interior (Hayes et al., 2012); já a IBCT enfatiza a aceitação dos sentimentos e das dificuldades a respeito do outro no relacionamento (Jacobson & Christensen, 1996); e, na DBT, as incoerências e a intensidade dos eventos interiores e os desafios externos do ambiente interpessoal podem ser igualmente objetos de aceitação (Linehan, 1993). No entanto, em nenhuma das vertentes apresentadas, a aceitação é um fim em si; ela é sempre um processo terapêutico em evolução. E, em cada uma das três vertentes, a aceitação e a mudança funcionam como pré-requisitos uma para a outra. A aceitação autoriza o indivíduo a ter dificuldades, e o casal, a ter diferenças. Se todo comportamento ocorre em um contexto que produz seu significado, as dificuldades do indivíduo e o comportamento do parceiro devem sempre ser compreendidos no contexto. O sentido que o comportamento de um cônjuge tem é resultado da história passada do indivíduo e do contexto atual do casal (Jacobson, 1997). O terapeuta procura promover, no casal, um recuo psicológico combinado com um engajamento de cultivar o que é valioso no relacionamento de acordo com os pacientes. Recuar significa que a pessoa se desapega suficientemente de suas expectativas e seus julgamentos para poder abrir mão da atribuição de culpa. O engajamento significa um envolvimento ativo ao enfrentar desafios relevantes para sua vida. No casal, esse distanciamento engajado é visível na expressão não abrasiva de emoções difíceis e na abertura para vivenciar problemas com a intenção de superá-los. A pessoa se envolve ativamente, norteado pelo que valoriza mais na relação de casal, mas mantem o recuo psicológico necessário para poder compreender suas ações no contexto mais amplo. Tal tomada de perspectiva ajuda aceitar emoções difíceis que fazem parte da sua vida de casal e ajuda a expressá-los sem culpar o outro. O distanciamento engajado o torna possível de reconhecer emoções positivas relacionadas com situações difíceis, e ajuda o casal a assumir uma atitude benigna frente aos desafios que fazem parte da sua vida conjugal (Jacobson & Christensen, 1996). O termo aceitação radical, usado por Linehan (1993), expressa a profundeza do que se pretende com o ato de aceitar a realidade como ela é e consiste em acolher o momento presente, o aqui e o agora, sem exigir que ele seja diferente do que é. O adjetivo “radical” alude à genuinidade e à profundidade do acolhimento da vida, incondicionalmente, em sua totalidade. Trata-se de um consentimento à vida nos termos impostos por ela, incluindo seus desafios, seus incômodos e suas dimensões trágicas. De acordo com a autora, a aceitação radical possui três partes: o consentimento completo e total de que a realidade é o que é, a acedência de que as situações que geram dor possuem causas e histórias e a compreensão de que sentimentos conflitantes e difíceis não impedem a valorização da vida.
Hayes e colaboradores (2012) descrevem a aceitação como o consentimento em acolher pensamentos e emoções, mesmo quando se apresentam de forma dolorosa. A definem como uma abertura intencional para a vivência interior. A pessoa escolhe relacionar-se de forma tolerante com seus conteúdos psicológicos, sem tentar fugir do que lhe é desagradável, e, ao mesmo tempo, lembra que seus pensamentos e sentimentos são nada mais que suas próprias produções e produtos da sua história e do seu contexto, não assumindo que representam o mundo real. Essa aceitação ajudará o indivíduo a reduzir a energia que investe na luta contra as emoções negativas e a engajar-se mais em ações construtivas. Ela o permite investir em um redirecionamento da sua vida, uma vez que não está mais refém da luta com as emoções difíceis. Schoendorff, Grand e Bolduc (2011) esmiúçam como o cliente pode construir, na ACT, uma aceitação profunda de suas angústias e dores ou de sua perplexidade diante de seus problemas. O primeiro passo para a construção da aceitação consiste em tomar consciência de emoções difíceis. Pode ser penoso assumir sentimentos problemáticos, já que os suprimir ou esquivar-se deles diminui o sofrimento, mas a supressão e a esquiva prejudicam a habilidade de viver o momento de forma plena, a conexão com a vivência interior e o contato genuíno com a outra pessoa com quem está interagindo em um momento difícil. O cliente descobre como, ao suprimir e esquivar, seu comportamento se tornou mais rígido. Ele chegou a responder menos a seus valores e a suas necessidades mais sutis. Ao dar-se conta desses prejuízos, pode decidir abandonar a supressão e a esquiva e optar por criar mais espaço dentro de si para permitir um leque maior de emoções, deixando-as ir e vir livremente. Ao cultivar maior abertura para a experiência, a pessoa ganha independência das regras e dos conceitos rígidos que fazem parte de seu condicionamento social. Essa independência se traduz em uma maior flexibilidade psicológica e uma libertação das amarras que prejudicam a criatividade e limitam a capacidade de enfrentar suas dificuldades. Aceitar a vivência interior é distinto de acreditar ou aderir ao conteúdo de seus sentimentos ou pensamentos. Aceitação não significa que a pessoa se submete à lógica de suas respostas internas, mas que apenas as considera e as autoriza. Aceitar permite tomar recuo e permite que a vivência interior flua livremente. Observando os pensamentos e sentimentos a partir de uma distância psicológica, o sujeito está aberto a receber e a considerar as dicas que sentimentos, pensamentos e outras respostas internas trazem a respeito do que ocorre em sua vida. Por exemplo, ao sentir tristeza em certa situação, aceitar significa acolher o sentimento e entendê-lo como um sinal, trazendo informações acerca da situação que vive e do sentido que essa situação tem em relação a sua história. Essa informação pode ajudá-lo a fazer escolhas consistentes com seus alvos e valores. O termo recuo é importante aqui, e não pode ser confundido com fuga ou rejeição. Significa tomar uma perspectiva não julgadora. A tristeza pode ser mais bem compreendida quando a pessoa não foge dela e nem se agarra a ela (Hayes et al., 2012). Imagine uma cliente que tem dificuldade para admitir o vazio que sente e a desilusão pela condição de seu casamento. Na sessão, ela nega ter esses sentimentos, e em seu dia a dia, tenta ignorá-los. Para ela, senti-los significa que fracassou, que não conseguiu ser o que ela e sua família exigem dela. Ser feliz no casamento é, de acordo com as regras que lhe foram impostas, uma tarefa a ser cumprida, comparável com sua ascensão na profissão. O sentimento de vazio é duro de aceitar sob essas premissas, mas rejeitá-lo dificulta compreender bem o que está ocorrendo em sua vida. Quando a terapia a ajuda a aceitar a legitimidade de seu sentimento de vazio, ajudará também a compreender o que ele mostra a respeito de suas escolhas e de seus valores. Primeiro, o terapeuta a ajudaria a fazer as pazes com seus sentimentos, acolhendo-as como mensageiros, e não como inimigos.
Para poder promover essa atenção para e abertura à experiência, o terapeuta também deve estar atento e aberto a acolher, sem julgar, seus pensamentos e sentimentos no momento (a vivência interna do terapeuta) e as emoções e reações do cliente (o ambiente externo). A mindfulness do terapeuta o ajuda a perceber mudanças sutis no comportamento do cliente, a escutar com atenção, a reconhecer seus próprios erros, a manter a conexão com seus valores e a lidar com momentos complexos e difíceis para poder estar plenamente presente com o cliente (Vandenberghe & Silveira, 2013). Dessa forma, prestar atenção, sem julgar, e com abertura para a experiência beneficia à aliança terapêutica (Razzaque, Okoro, & Wood, 2015). Nessas condições, o relacionamento com o terapeuta é um terreno privilegiado para ajudar o cliente a cultivar atenção plena, abertura e aceitação. A interação com um terapeuta que está mindful oferece um ambiente interpessoal seguro, no qual o cliente pode se abrir para pensamentos e sentimentos difíceis. Quando percebe que o cliente rejeita aspectos difíceis de sua vivência interior ou tenta se esquivar deles, o terapeuta o ajuda de forma delicada, a entender o que está ocorrendo. Assim, o cliente pode aprender a identificar sua esquiva interior também em outros momentos, fora da sessão (Hayes et al., 2012; Schoendorff et al., 2011). É possível conceber a aceitação como o ato de tomar um tempo para sentir o que está ocorrendo dentro de si. Trata-se da opção de ceder um espaço para a vivência interior, para acolher o que a situação evoca em nós. Para preparar esse espaço, o terapeuta convida o cliente a desacelerar, para conseguir observar com equanimidade os sentimentos e pensamentos que se apresentam. O fluxo natural de pensamentos e sentimentos é comparado, por Schoendorff e colaboradores. (2011), a um riacho pelo qual passam tanto dicas válidas quanto enganosas, além de, metaforicamente falando, anzóis com iscas atraentes que despistam a pessoa do compromisso com seus valores. Um anzol seria, nessa metáfora, um impulso ou julgamento que não apresenta perigo algum se o peixe (a pessoa) não “morde”. Ao convidar o cliente a desacelerar e recuar, o terapeuta só inicia o processo que permitirá ao cliente explorar e, gradualmente, conhecer melhor o fluxo de sua vivência interior, para discriminar os anzóis e fazer melhores escolhas para sua vida (Schoendorff et al., 2011). Consentir à plenitude da vivência do momento o torna possível direcionar seus esforços à realização de uma vida mais valiosa. A aceitação de sentimentos e sensações difíceis confere mais liberdade para agirmos em um mundo que não está sob nosso controle, mas no qual podemos nos envolver ativamente (Linehan, 1993).
VALIDAÇÃO
Na presente seção discutimos como, nas três terapias apresentadas, a validação é uma intervenção clínica importante em resposta à vivência do cliente. Porém, antes disso, explana-se como a validação não é somente parte do processo terapêutico, mas também uma habilidade do dia a dia de casais, que ajuda cultivar a aceitação entre os parceiros e tornar sua comunicação mais eficiente (Jacobson & Christensen, 1996; Fruzetti & Iverson, 2004) e uma precondição para o desenvolvimento psicológico saudável do indivíduo (Linehan, 1993). Entre as diversas técnicas de comunicação ensinadas na terapia de casal, a validação é uma habilidade crucial. Consiste em expressar que a perspectiva e os sentimentos do parceiro foram compreendidos. Como estratégia de comunicação, a validação ajuda os parceiros a lidar com conflitos e a dialogar sobre diferenças (Jacobson & Christensen, 1996). De acordo com Linehan (1993), pessoas com transtorno de personalidade borderline muitas vezes foram criadas em ambientes familiares e sociais onde suas necessidades e seus sentimentos não foram validados e, por consequência, elas não aprenderam a confiar em sua própria vivência interior. A validação pelos pais e por outras pessoas importantes na vida da criança é crucial para ajudá-la a desenvolver uma conexão saudável com sua vivência interna. A validação ocorre em diferentes níveis e graus. De acordo com Linehan (1993, 1997), apenas escutar com atenção já funciona como uma forma de validação, mas, para Jacobson e Christensen (1996), é necessário algo a mais. Além do simples fato de comunicar ao seu parceiro que se prestou atenção ao que ele falou, é preciso também deixar claro que se levou em consideração o que o ele alega. Ao comunicar que o ouvinte leva em consideração os sentimentos do outro, mesmo sem concordar, ele afirma que há algo plausível ou cabível nesse conteúdo, ao menos do ponto de vista do outro. Essa explanação da validação como estratégia de comunicação em casais ou em famílias também pode servir como modelo para compreender como ocorre a validação da vivência do cliente por parte do terapeuta, e isso é um ingrediente importante no processo terapêutico. Como uma ação do terapeuta, a validação pode ser definida como o ato de comunicar que o ponto de vista e o sentimento expressos pelo cliente são apropriados e compreensíveis (Linehan, 1993; McFarr et al., 2014). Jacobson e Christensen (1996) enfatizam a diferença entre validar, concordar e refletir. Concordar seria expressar que a perspectiva do terapeuta é igual à do cliente. Refletir (como um espelho) seria captar o estado emocional do cliente, devolvendo para ele o que falou, usando termos que tornam mais explícitos as emoções subjacentes. Refletir, nesse sentido, é uma técnica importante que o terapeuta usa para verificar se compreendeu a vivência emocional expressa pelo cliente. O terapeuta pode também refletir especificamente o teor emocional da fala do cliente para mostrar que está sincronizado com seus sentimentos. Validar, para esses autores, vai além de refletir, pois ao validar o terapeuta mostra que considera plausível a perspectiva e os sentimentos expressos pelo cliente cabíveis, mesmo que não correspondam com a perspectiva do terapeuta. Linehan (1997) e Koerner (2012) também distinguem validar de concordar, mas, diferente de Jacobson e Christensen (1996), acreditam que o ato de refletir os sentimentos do cliente já pode implicar certa medida de validação. Mesmo escutar com atenção já constitui um início de validação, de acordo com Linehan (1993, 1997) e Koerner (2012). As autoras concebem uma hierarquia de intervenções que representam vários graus de validação e enfatizam que o terapeuta deve procurar alcançar o grau mais avançado desejável em cada contexto. Por sua vez, articular o sentimento que ficou implícito na fala do cliente já confere maior grau de validação que a escuta atenta por si só, por exemplo: “Ao ouvi-lo falar, entendo que está com muita raiva pelo que aconteceu”. Uma forma mais avançada de validar que o ato de refletir o que o cliente sente é descrever como seu comportamento e sua vivência fazem sentido em termos de sua história passada. O terapeuta, nesse caso, comunica explicitamente que considera válidas suas reações com semblante disfuncional ou patológico, considerando o que o cliente já viveu. Por exemplo: “Entendo que esteja com muita raiva pelo que aconteceu, pois, quando criança, você teve de aguentar situações parecidas sem poder se defender”. No próximo grau de validação, o terapeuta explica como o comportamento do cliente faz sentido lógico nas circunstâncias atuais. Esse trabalho exige uma análise racional da situação de vida do cliente. Quando se trata de sentimentos exagerados e ações que, à primeira vista, são inadequadas, o terapeuta não sente de imediato, que elas fazem sentido na atual situação. Talvez precise fazer um esforço maior para descobrir como os sentimentos podem também ser compreensíveis e cabíveis no contexto de vida atual do cliente. Por exemplo: “Posso imaginar que você fique com muita raiva porque a outra pessoa não expõe suas intenções e, assim, você não pode se defender”. Embora precise fazer esse esforço intelectual para descobrir ao menos algo no momento atual que possa justificar a perspectiva do cliente, o terapeuta não deve distorcer os fatos. O comportamento validado deve verdadeiramente fazer sentido para o terapeuta depois da análise feita. Somente os aspectos realmente validos da reação do cliente devem ser validados. O nível mais avançado de validação, de acordo com Linehan (1993) e Koerner (2012), consiste em sentir genuinamente e comunicar espontaneamente que os atos e sentimentos do cliente fazem sentido, do ponto de vista do terapeuta, naquele momento. Para esse caso, não precisa de análise racional ou exame lógico da situação. Por exemplo: “Agora me vejo no seu lugar. Tudo isso é chocante. Posso sentir exatamente o que você está passando”. Talvez mais fundamental que validar sentimentos e comportamentos seja a validação da pessoa do cliente, quando o terapeuta deixa claro que considera o cliente capaz de assumir sua própria perspectiva e que não precisa ser ajustado para ter uma vida mais valiosa (Hayes et al., 2012). A validação pelo terapeuta é útil para ensinar o cliente a validar a si mesmo diante dos contextos de sua vida, e isso é importante porque muitos clientes não confiam na validade de seus sentimentos. Esse é o caso daqueles cujos sentimentos e pontos de vista foram com frequência invalidados por sua família (Linehan, 1993), ou pelas expectativas culturais e as regras prescritas em seu ambiente social (Jacobson & Christensen, 1996). Para poder validar, o terapeuta precisa verificar e compreender o sentido que as reações do cliente possuem no contexto, compreender suas próprias reações ao que o cliente vivencia e expressar essa compreensão a ele (Vandenberghe & Silveira, 2013). Linehan (1993) descreve três passos para realizar esse processo. O primeiro é a observação ativa, na qual o terapeuta reúne informações sobre o que aconteceu e está acontecendo com o cliente. O terapeuta escuta e observa o que o cliente relata estar pensando, sentindo e fazendo, e é preciso despir-se de qualquer conceito e até de teorias e pontos de vista pessoais que possam atrapalhar a observação. No segundo passo, o terapeuta relata ao cliente o que observou, muitas vezes defendendo observações que o cliente já tinha feito sobre si mesmo, mas não tinha assumido como válidas, oportunizando ao cliente corrigir as percepções do terapeuta. No terceiro passo, o terapeuta esclarece o que há de sábio no comportamento e nas emoções do cliente. Ao validar o ponto de vista do cliente, o terapeuta aceita o que ele traz para a sessão, e isso tem implicações para o processo terapêutico. A ênfase colocada em validar a perspectiva do cliente produz um paradoxo quando seu ponto de vista se opõe ao do terapeuta. A flexibilidade do terapeuta deve permitir que os clientes sejam espontâneos em expressar suas perspectivas. E o terapeuta deve ser capaz de enxergar o que há de valido em pontos de vistas com os quais não concorda. Impor a visão do terapeuta arriscaria invalidar o que o cliente sente, por isso, o terapeuta precisa estar disposto a aceitar, inclusive, a indisposição do cliente em colaborar com a terapia, apesar de essa aceitação não significar que concorda com seu posicionamento. A validação, por parte do terapeuta, da resistência do cliente evita que ambos travem uma luta pelo controle da terapia e permite que novos caminhos de mudança sejam descobertos, os quais teriam continuado despercebidos se o profissional tivesse tentado superar a resistência dos clientes (Jacobson & Christensen, 1996). Na ACT, é possível verificar um raciocínio similar. O terapeuta evita usar seus próprios objetivos como critérios para a validação. Por exemplo: quando o cliente não consegue enxergar uma saída para seus problemas, isso pode travar o progresso para a terapia. O terapeuta não teria motivos para validar o sentimento de desamparo e a falta de colaboração com a terapia, porém, do ponto de vista do cliente e no seu contexto de vida, esse sentimento pode fazer total sentido. O terapeuta não tentará convencê-lo de abandonar a resistência. Validar o sentimento do cliente de não ver saída pode parecer um ato paradoxal para o terapeuta, mas, muitas vezes abra a porta para mais aceitação e abertura por parte do cliente. Tentar convencê-lo de que há soluções disponíveis pode deixá-lo mais descrente (Vincent, 2004). O terapeuta deve ser sensível em relação à dosagem de validação que um determinado cliente (McFarr et al., 2014) ou casal (Jacobson & Christensen, 1996) precisa, e a DBT coloca as estratégias de validação em interação com as de solução de problemas. Engajando-se na terapia, buscando soluções para seus problemas, o cliente se compromete a mudar, o que favorece a perspectiva do profissional cujo trabalho seria de mudar o comportamento do cliente. Assim, arrisca-se definir o cliente como alguém inadequado, necessitando de concerto. As estratégias de validação são usadas para ajudar o cliente a entender como suas ações, emoções e pensamentos fazem sentido diante de sua realidade. Assim, há uma dialética entre validar e desafiar que põe as perspectivas do cliente e do terapeuta no mesmo patamar. Se a terapia enfatizasse demasiadamente a mudança, apoiaria implicitamente a ideia de que as emoções e as atitudes do cliente estão erradas. Por outro lado, a ênfase em validação apoiaria a ideia de que nada precisa mudar. Assim, as técnicas de desafiar os posicionamentos do cliente e de validar suas perspectivas devem ser usadas de forma conjugada em cada intervenção, evitando-se que o processo terapêutico entre em estagnação devido a um desequilíbrio entre os dois tipos (Linehan, 1993). Na literatura sobre IBCT, essa dialética é descrita em termos de uma interação entre dois conjuntos de técnicas de intervenção. A validação é, nessa vertente, apenas uma entre muitas estratégias para promover a aceitação (Jacobson & Christensen, 1996). Alguns casais precisam de mais aceitação, enquanto outros precisam de mais mudança, e, para cada um, deve ser encontrado um equilíbrio entre esses dois tipos de intervenções. Sendo necessário procurar a medida certa de validação que os parceiros precisam, é importante que o terapeuta não valide todas as emoções que eles relatam. Não deve ser um processo automático; é importante saber quando e porque validar. A validação deve ser usada propositalmente para alcançar objetivos terapêuticos claros, pois torna impasses superáveis na relação terapêutica e possibilita mudanças específicas na vida dos clientes. A ACT possui a mesma visão complexa a respeito da relação entre os dois tipos de intervenção. Podemos retomar o exemplo em que o terapeuta valida a resistência à terapia e o sentimento do cliente de estar travado. Ao validar o desamparo e a agonia, o terapeuta permite que o cliente mude sua relação com esses sentimentos, e pode convidá-lo a desacelerar por um momento e a observar a experiência de angústia e descrença com atenção. Ao debruçar-se sobre esses sentimentos dessa forma, o cliente já mudou sua maneira de se relacionar com eles, e, ao assumir uma nova perspectiva, já iniciou a mudança terapêutica que pode ajudá-lo a descobrir quais valores importantes estão envolvidos nesse sofrimento e devem ser resgatados para que seja possível sair do impasse (Vincent, 2014).
ACEITAÇÃO E VALIDAÇÃO DE MÃOS DADAS
No modelo da ACT, a mindfulness ajuda o paciente parar a luta contra a dor. Ao investir sua energia na luta contra os conteúdos psicológicos dolorosos, as pessoas se arriscam a ficar presas em uma batalha sem êxito, o que impede que cuidem e valorizem sua vida. É preciso aceitar os conteúdos difíceis e abandonar a batalha para ter as mãos livres para construir um projeto de vida valorizada. Mindfulness é usado como instrumento para promover a aceitação e começar a reposicionar-se frente à vivência interna. Em vez de sacrificar o que é importante em sua vida para poder evitar emoções difíceis, a pessoa descobre como investir na realização de seus valores mais preciosos (Hayes et al., 2012). Se mindfulness consiste em estar aberto para a vivência, intencionalmente, sem intelectualizar ou fazer julgamentos, no momento em que esta desabrocha, ele implica também em um desapego dos conceitos e preconceitos do cotidiano. Assim, possibilita ao cliente reposicionar-se em seu relacionamento com seu mundo interior e ajuda a entender seus pensamentos, avaliações e outros conteúdos psicológicos como sendo nada mais do que a evidência da sua própria história de vida e do seu contexto atual. Assim, o cliente deve identificar o que é realmente importante para ele em cada situação, desconsiderando as iscas que se apresentam (Schoendorff et al., 2011). A DBT usa mindfulness como fundamento para todos os outros módulos do tratamento, pois dá suporte à integração de polaridades e traz mais facilidade para que o cliente construa uma síntese dialética das contradições em sua vida, para descobrir sentido no caos da sua vivência fragmentada. A mindfulness ajuda na regulação de emoções porque facilita colocar emoções intensas e variações abruptas em seu devido contexto. Sua prática também dá suporte ao desenvolvimento de habilidades interpessoais, pois ajuda a agir de forma que as emoções não controlem a situação e permite enxergar o que realmente importa em certo relacionamento ou situação (Linehan, 1993). Ao contrário da ACT e da DBT, o modelo terapêutico da IBCT foi desenvolvido, originalmente, sem incluir uma elaboração explícita do conceito de mindfulness. Somente ao divulgar o novo modelo, seus autores descobriram que outros psicólogos reconheceram, na promoção de aceitação, essa qualidade da filosofia oriental (Jacobson & Christensen, 1996). Ao examinar melhor como a validação é ensinada como estratégia de comunicação para o casal, fica claro como ela está interlaçada com o processo de aceitação e como mindfulness é um pré-requisito para validar a outra pessoa (Fruzetti & Iverson, 2004). É necessário estar presente no momento, prestando total atenção ao comportamento do outro, aberto, sem categorizações ou racionalizações, para, em seguida, poder validar genuinamente o que a outra pessoa expressou. A prática de mindfulness por um casal aumenta a aceitação do parceiro e sustenta a capacidade de lidar de forma produtiva com o estresse do relacionamento (Barnes, Brown, Krusemark, Campbell, & Rogge, 2007). Estar aberto e curioso (duas características de mindfulness) facilita compreender a perspectiva do outro, em vez de olhar as coisas de um único ponto de vista. Identificar e contextualizar as próprias emoções no momento em que elas desabrocham permite separá-los da perspectiva do parceiro e facilita uma comunicação mais clara e uma resposta mais empática (Cordova, Gee, & Warren, 2005; Mirgain & Cordova, 2007). Da mesma forma, o terapeuta que valida a vivência do cliente precisa estar intencionalmente atento ao momento presente, suspendendo a elaboração teórica, permitindo-se ser orientado pela curiosidade, pela abertura e pela aceitação emocional, além de compreender e saber contextualizar as próprias respostas emocionais, para poder separá-las da perspectiva do cliente. Assim, pode oferecer sua intervenção com base no contexto vivido do cliente, e não baseado no seu critério (Vandenberghe & Silveira, 2013). Isso torna a mindfulness do terapeuta uma precondição fundamental para se pensar o processo de validação no consultório. É difícil isolar a contribuição da mindfulness da dos outros elementos empregados nas terapias discutidas. A promoção de mindfulness na sessão ajuda o cliente ou o casal a considerar seu problema de diferentes ângulos para poder lidar com ele de forma mais flexível. Ele sustenta tanto a aceitação quanto o compromisso com a mudança (Hayes et al., 2012; Linehan, 1993; Cordova et al., 2005), e está intrinsecamente entrelaçado no tecido do processo terapêutico.
CONCLUSÃO
A linguagem de mindfulness não deve ser colocada em segundo plano no tratamento ou considerada apenas uma técnica auxiliar para ser indicada aos pacientes como atividade de autocuidado. Ela é a atitude terapêutica e, ao mesmo tempo, a filosofia profunda que sustenta as práticas de validação e de aceitação em várias terapias contemporâneas. A procura de um equilíbrio entre estratégias de mudança e de aceitação e validação merece um lugar mais centralizado nos programas de formação em terapia cognitivo-comportamental e até mesmo nos aconselhamentos por conselheiros. Como a ACT usa o trabalho de mindfulness para ajudar a pessoa a fazer uma melhor conexão com o Eu-como-Perspectiva, a DBT o utiliza para promover melhor conexão com a mente sábia, e a IBCT, para beneficiar a comunicação e a aceitação no casal. O equilíbrio entre a validação e a aceitação de um lado e o questionar e o desafiar de outro lado flexibiliza as ferramentas do diálogo terapêutico. Além disso, os conceitos de mindfulness, validação e aceitação oferecem uma linguagem que ajuda a mentalizar alguns processos importantes que ocorrem na sessão, tão importantes quanto os enfatizados tradicionalmente na literatura. Porém, o desenvolvimento de mindfulness como característica do terapeuta (Vandenberghe & Silveira, 2013; Razzaque et al., 2015) merece maior atenção, pois, como mindfulness está ligado à validação e à aceitação em relações íntimas, tem os mesmos benefícios na comunicação entre terapeuta e paciente. Ainda, é preciso estabelecer de maneira mais clara de quais formas a inclusão de técnicas de validação e aceitação deixam o trabalho do terapeuta cognitivo-comportamental mais eficiente, comparado com as técnicas de reestruturação e mudança cognitiva e comportamental. Definir tanto a TAC como a CBA como terapias fundamentadas na filosofia do behaviorismo radical e na ciência da análise do comportamento poderia sugerir, à primeira vista, que TAC, ACT, FAP, DBT, BA, IBCT e MBT são totalmente compatíveis entre si ou, até mesmo, que são apenas nomes diferentes para um mesmo tipo de prática. Entretanto, a relação entre elas não é tão simples assim.
Por um lado, ambas defendem a transposição de princípios comportamentais empiricamente validados, mas, por outro, alguns modelos terapêuticos encerrados sob a CBA apresentam desprendimento com os princípios teórico-conceituais da análise do comportamento e fazem uso de um linguajar que soa mentalista para aqueles que valorizam o jargão Skinneriano (Vandenberghe, 2011). Por exemplo, diversos autores (e.g. Foody, Barnes-Holmes, Barnes-Holmes & Luciano, 2013; Guilhardi, 2012; McEnteggart, Barnes-Holmes, Hussey & Barnes-Holmes, 2015) argumentam que os termos utilizados pela ACT, como fusão cognitiva, aceitação, mindfulness (atenção plena), self conceitualizado e self como contexto, entre outros, não possuem qualquer relação com o vocabulário analítico-comportamental ou com os fundamentos filosóficos, teóricos e empíricos dessa abordagem, o que dificulta compreensão recíproca. A despeito de qual seja a relação entre TAC e as diferentes modalidades de terapia abarcadas sob o rótulo CBA, o cenário histórico descrito aqui permite constatar que, tanto no Brasil quanto no resto do mundo, ainda não existe consenso sobre o modelo analítico-comportamental de intervenção psicoterápica. Nesse sentido, pesquisas futuras deveriam ocupar-se de analisar tanto o grau de embasamento teórico, empírico e prático desses diferentes modelos de terapia na análise do comportamento, assim como as semelhanças e diferenças entre eles, de modo a buscar um modelo homogêneo de uma análise do comportamento clínica / terapia analítico-comportamental.
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