RESUMO

O uso abusivo de substâncias psicoativas tem sido um sério problema social e de saúde pública. A dependência química é uma doença crônica, causando necessariamente prejuízos e sofrimentos significativos do ponto de vista social. Sendo assim, o presente artigo tem como objetivo revisar a literatura sobre a neuropsicologia na dependência química e o impacto das substâncias psicoativas nas funções executivas, que podem afetar na adesão ao tratamento e manutenção da abstinência.

Palavras-chave: Dependência Química. Neuropsicologia. Funções Executivas. Cognição.

DESENVOLVIMENTO

Para a Organização Mundial da Saúde, através da Classificação Internacional de Doenças – CID-10 (1996), os critérios para diagnóstico da dependência química são descritos como: desejo intenso de consumir a droga, dificuldade de controlar o consumo, síndrome de abstinência, evidência de tolerância, utilização persistente apesar das suas consequências prejudiciais e prioridade ao uso da droga em detrimento de outras atividades e obrigações.
A dependência química causa mudanças relevantes na interação do indivíduo com seus familiares afetando suas relações sociais e também profissionais. Há um conjunto de sintomas cognitivos, comportamentais e fisiológicos que contribuem
para a compulsão pelo uso das substâncias, mesmo com os problemas significativos recorrentes e tendência às recaídas.
A partir dos avanços dos métodos de neuroimagem, sabe-se que as drogas provocam alterações em várias regiões cerebrais, essas modificações cerebrais prejudicam diversas capacidades cognitivas, como a atenção, memória, processamento de emoções, funções executivas e tomada de decisão. Esses déficits cognitivos vão depender da substância utilizada, intensidade, frequência de uso e formas de administração.
As funções executivas podem ser definidas como “as habilidades cognitivas necessárias para realizar comportamentos complexos dirigidos para determinado objetivo e a capacidade adaptativa as diversas demandas e mudanças ambientais” (LORING, 1999, p. 64). Comportamentos esses que vão depender da integridade de vários processos cognitivos, emocionais e motivacionais associados ao funcionamento dos lobos frontais (GOLDSTEIN & VOLKOW, 2002).

Aplicada à dependência química, a neuropsicologia pode contribuir para o delineamento do perfil cognitivo, identificando a dimensão e a gravidade do comprometimento das funções executivas, bem como os recursos preservados, facilitando no planejamento dos procedimentos de reabilitação e no acompanhamento da evolução do quadro. A neuropsicologia estuda a relação entre cérebro e comportamento cognitivo, sensorial, motor, emocional e social do indivíduo (HOWIESON & LEZAK, 1997), sendo crucial uma anamnese bem formulada e detalhada, investigando como era o funcionamento cognitivo do indivíduo antes da instalação da dependência da droga, para identificar se ela alterou seu desempenho cognitivo ou se os prejuízos encontrados já o acompanhavam desde sua infância.
As funções executivas permitem a manutenção de um funcionamento mental adequado para alcançar um objetivo futuro, contribuindo na capacidade do indivíduo de iniciar ações, planejar e antecipar meios de solucionar problemas, prever consequências e mudar estratégias de forma flexível. Sendo assim, para
Cunha e Novaes (2004), o comprometimento dessas funções pode atrapalhar no processo de tratamento, gerando dificuldades na compreensão e em assimilar conceitos básicos da terapia, como traçar metas e cumprir objetivos, podendo contribuir para uma baixa adesão ao tratamento.
O processo de reabilitação neuropsicológica parte da identificação das áreas de necessidade, hierarquização de necessidades e multidisciplinaridade dinâmica orientada a objetivos definidos, levando em consideração a história de vida do paciente (GINARTE-ARIAS, 2002). De acordo com Ávila (2003), a reabilitação neuropsicológica visa capacitar o paciente a desenvolver um bom nível de funcionamento social, físico e psíquico. Isso pode ocorrer através da otimização das funções cognitivas por meio do bem-estar psicológico e do relacionamento social, envolvendo os pacientes e seus familiares, levando em conta o ambiente em que vivem, os fatores subjetivos e sua biografia.

CONCLUSÃO
Os comprometimentos cognitivos podem dificultar os processos de aprendizagem e influenciar negativamente na aderência ao tratamento, assim como, interferir nos procedimentos de reabilitação. Torna-se necessário que as avaliações sejam individualizadas, visando à elaboração das melhores estratégias terapêuticas para cada caso, aumentando as chances de sucesso no tratamento.

REFERÊNCIAS
Ávila, R. Resultados da reabilitação neuropsicológica em paciente com doença de Alzheimer leve. Revista Psiquiatria Clínica. São Paulo. 2003. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rpc/v30n4/v30n4a04

Cunha, P. J., & Novaes, M. Avaliação neurocognitiva no abuso e dependência do álcool: Implicações para o tratamento. Revista Brasileira de Psiquiatria, 2004. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S151644462004000500007&script=sci_abstract&tlng=pt

Ginarte-Arias, Y. Rehabilitación cognitiva. Aspectos teóricos y metodológicos. Revista De Neurologia, 2002.

Godman, A. Addiction: Definition and implications. British Journal of addiction, 1990.

Goldstein, R. Z., & Volkow, N. D. Drug addiction and its underlying neurobiological basis: Neuroimaging evidence for the involvement of the frontal cortex. The American Journal of Psychiatry, 2002.

Howieson DB, Lezak MD. The neuropsychological evaluation. In: Yudofsky SC, Hales RE, editors. Textbook of neuropsychiatry. Washington, D.C.: American Psychiatry Press; 1997.

Loring, D. INS Dictionary of neuropsychology. New York: Oxford University Press, 1999.

Organização Mundial da Saúde. Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde: CID-10 Décima revisão. Vol 2, 3 ed. São Paulo, 1996.

O impacto das substâncias psicoativas nas funções executivas