ALUNO: LUIS ANTONIO DA SILVA VIEIRA
RESUMO
O uso de drogas é uma realidade cada vez mais difícil de vencer, pois temos um emaranhado de elementos que tornam cada vez mais natural o uso de drogas, que dissolvem o poder agregador e estruturador da família, que despersonalizam o indivíduo e desarticulam os referenciais positivos da vida. Temos, então, três aspectos importantes que devem ser considerados quando lidamos com a dependência: um desafio que envolve o dependente, a família do dependente (codependência) e a realidade atual da nossa sociedade chamada pós-moderna.
Palavras chaves: Codependência, Família e Dependente.
INTRODUÇÃO
Estamos vivendo historicamente o que se designa por pós-modernidade. Uma série de sintomas marcados pela perda dos referenciais, de um excesso de individualismo e mais uma série de características, a qual, a perda das relações e a superficialidade são algumas delas.
Uma das características para pensarmos a relação da codependência é o que chamamos de declínio da Lei-do-Pai, cujo efeito mais imediato no social é anomia. A palavra tem origem grega e vem de a + nomos, donde significa ausência, falta, privação e inexistência; e nomos quer dizer lei, norma. Etimologicamente, portanto, anomia significa falta de lei ou ausência de norma de conduta. A anomia é um estado de falta de objetivos e perda de identidade, provocado pelas intensas transformações ocorrentes no mundo social moderno. A partir do surgimento do capitalismo, e da tomada da Razão, como forma de explicar o mundo, há um brusco rompimento com valores tradicionais, fortemente ligados a concepção religiosa. A modernidade, com seus intensos processos de mudança, não favorecem novos valores que preencham os anteriores demolidos, ocasionando uma espécie de vazio de significado no cotidiano de muitos indivíduos. Há um sentimento de se “estar à deriva”, participando inconscientemente dos processos coletivos /sociais: perda quase total da atuação consciente e da identidade.
Por que estamos trazendo essas questões? Porque essa realidade pós-moderna é muito parecida com os sintomas apresentados pelos dependentes e codependentes, ou seja, estamos vivendo um momento social disfuncional, onde isso afeta as famílias, favorecendo os sintomas da dependência e codependência.
Diante dessa realidade podemos dizer que salvar a família é poder salvar o dependente de drogas, resgatar o dependente é resgatar a família, pois a desestruturação familiar abre espaço para o colapso da humanidade. Com isso a família, que é a base fundamental, geradora do indivíduo, aumenta consideravelmente o seu papel no combate ao vício e apoio para que o dependente se livre das drogas.
A família é um sistema, em que todos estão numa relação de reciprocidade, e toda relação é baseada em algum tipo de comunicação e pacto estabelecidos são, muitas vezes, formas de manter relações e papéis patologizados como é o caso da dependência. Assim a família pode ser tanto um fator protetor de qualquer tipo de doença mental, como transformar-se em um fator de risco para o desenvolvimento de várias disfunções.
DESENVOLVIMENTO
Codependência é um transtorno emocional definido e conceituado por volta das decádas de 70 e 80. De inicio, a descrição deste quadro incluía apenas familiares de pacientes alcoólicos, mas com o tempo o seu significado foi ampliado e atualmente o termo codependência também inclui a conduta relacionada aos familiares dos dependentes químicos, familiares e/ou pessoas significativas que têm um problema de comportamento no relacionamento de intimidade, de jogo patológico e outros problemas sérios da personalidade.
Um indivíduo codependente é aquele que deixou-se influenciar pelo comportamento de outra pessoa e que vive obcecado em controlar o comportamento desse outro, através de uma situação emocional, psicológica e comportamental que se desenvolve como resultado da exposição individual prolongada à prática de um conjunto de regras opressivas – regras que impedem a expressão aberta dos sentimentos, bem como, a discussão direta de problemas pessoais e interpessoais.
A codependência é para se referir aqueles, geralmente parentes, cujas as vidas foram afetadas pela forte ligação a uma pessoa com séria dependência física e /ou psicológica de uma substância.
Melody Beattie oferece uma série de comportamentos que os codependentes apresentam:
– Considerar-se e sentir-se responsável por outra(s) pessoa(s) – pelos sentimentos, pensamentos, ações, escolhas, desejos, necessidades, bem estar, falta de bem-estar e até pelo destino dessa(s) pessoas.
– Sentir ansiedade, pena e culpa quando a outra pessoa tem um problema.
– Sentir-se compelido – quase forçado – a ajudar aquela pessoa a resolver o problema, seja dando conselhos que não foram pedidos, oferecendo uma série de sugestões ou equilibrando emoções.
– Ter raiva quando sua ajuda não é eficiente.
– Comprometer-se demais.
– Culpar outras pessoas pela situação em que ele mesmo está.
– Dizer que outras pessoas fazem com que se sinta da maneira que se sente.
– Achar que a outra pessoa o está levando à loucura.
– Sentir-se vítima, achar que está sendo usado e que não se sente apreciado.
– Achar que não é bom bastante.
– Contentar-se apenas em ser necessário a outros.
Uma das características são comportamentos auto-derrotistas, aprendidos ou devido a defeitos de caráter, que resultam numa capacidade reduzida de iniciar ou participar em relações amorosas.
Estamos analisando os aspectos patológicos das famílias de adictos, como as famílias codependentes, famílias pré-adictivas (aquelas onde os pais não conseguem exercer seus papéis adequadamente) e famílias disfuncionais justamente pela importância que possui na formação da personalidade. Tanto que Scivoletto relata o trabalho de Mackay e cols, em que observaram que as famílias de dependentes apresentavam disfunções, principalmente na áreas envolvidas com expressão de afeto e de estabelecimento de limites e papéis na estrutura familiar. É difícil para o indivíduo aprender a lidar com seus sentimentos quando vive numa ambiente no qual as emoções não são expressadas, discutidas ou pouco toleradas. Da mesma forma, em famílias nas quais os papéis de cada membro não são claros e há ausência de limites precisos, torna-se difícil para o adolescente acreditar que a família atenderá suas necessidades. O contato e o atendimento familiar são extremamente importantes quando pensamos em um tratamento para dependência química, pois é com a família que os pacientes vivem questões do seu dia-a-dia e onde ocupam espaço que as impede, na maioria das vezes, de vislumbrar um lugar diferente, que não o de bode expiatório, e onde a tônica recai sempre sobre a dependência da substância. A família patológica precisa, de alguma maneira, transferir para as drogas e para o dependente os problemas, para que outras questões tão ou mais patológicas relacionadas à dinâmica familiar não se façam presentes. Neste sentido, é importante salientar que um dos objetivos cruciais do trabalho com a família é o de permitir que o paciente saia o papel de bode expiatório abrindo possibilidade para que ele possa começar a levantar alguma questão a respeito de si e do seu grupo familiar.
A codependência afeta o indivíduo em cinco vertentes:
1 – Baixa autoestima;
2 – Dificuldade de estabelecer limites saudáveis nos relacionamentos de intimidade;
3 – Dificuldade de reconhecer e assumir sua própria realidade disfuncional (negação e ilusão);
4 – Dificuldade de assumir a responsabilidade em gerir as suas necessidades adultas(atitudes, emoções e comportamentos);
5 – Dificuldade de identificar e expressar suas emoções de forma moderada(ex. raiva, ressentimento, medo, culpa e vergonha).
Em algumas famílias codependentes o desenvolvimento das crianças é afetado porque o sistema familiar (homeostase) é caótico.
Na família do dependente as relações familiares e a comunicação interpessoal vão se tornando cada vez mais complicadas, A comunicação se faz confusa e indireta, de modo que é mais fácil encobrir e justificar a conduta do dependente do que discuti-la. Esta dificuldade (disfunção) vai se convertendo em estio de vida familiar e produzindo, em casos, o isolamento da família dos contatos sociais cotidianos. As regras familiares se tornam confusas, rígidas e injustas para os seus membros, de forma que os deveres passam a ser distorcidos, com algum prejuízo das pessoas que não têm problemas e privilégios da pessoa problemática.
Como se vê, a conduta codependente é uma resposta doentia ao comportamento da pessoa problemática(dependente), e se converte em um fator chave na evolução da dependência, isto é, a codependência promove o agravamento da pessoa problemática(dependente), processo chamado facilitação. Mas, os codependentes não se dão conta de que estão facilitando o agravamento do problema, em parte pela negação e em parte porque estão convencidos de que a sua conduta esta justificada, uma vez que estão “ajudando” o dependente a não se deriorar ainda mais e que a família não se desintegre.
Valente nos lembra que, além da dinâmica patológica da família, o paciente dependente de drogas é um indivíduo para quem a droga passou a desempenhar um papel central na sua organização patológica. Mesmo quando a substância já não proporciona mais o prazer inicial, ao preencher lacunas importantes em seu funcionamento psíquico, ela trona-se indispensável, e o que significa que um dependente não pode prescindir da sua droga. Desta forma a retirada da droga é um trabalho difícil e doloroso.
A droga funciona para o dependente como garantia permanente de que ele não será confrontando com o sentimento de abandono e desamparo. Abster-se dela, remete o paciente dependente à sua problemática inicial e ao inevitável confronto com a experiência do vazio. A família tem o desafio de se tornar esse lugar vazio, para isso ela tem que combater o seu próprio vazio dentro de uma sociedade também vazia.
Muitos pacientes dependentes apresentam quando crianças, características familiares, onde sofriam negligência, falta de apoio e modelo moral adequado dos pais. Em relação ao modelo moral dos pais, esses pacientes não vivenciaram exemplos de justiça, empatia e solidariedade no seio familiar, colocando-os, desta maneira, em maior risco para o desenvolvimento da dependência química. Há relatos também de abusos físicos e psicológicos. Alguns foram deixados pelas suas mães desde muito cedo, aos cuidados de familiares ou conhecidos, pois tinham que retornar ao trabalho, ou mesmo, sentiam-se incapazes para assumirem os seus cuidados. Além disso, muitos dependentes têm uma família que não acolhem suas dificuldades, onde eles evitam falar para evitar punições severas sofridas em casa, gerando um sentimento de não existência, baixa auto-estima e não pertencimento ao grupo familiar.
A codependência por ser uma doença emocional e comportamental pode ser agravante e desencadeante de depressão, hipertensão, diabetes,suicídio, doenças psicossomáticas, e outros transtornos.
Os grupos de ajuda aos familiares de dependentes químicos visam principalmente, reverter este quadro, orientando os familiares a adotarem comportamentos mais saudáveis. O primeiro passo em direção a esta mudança é tomarem consciência e aceitarem o problema.
O tratamento da codependência pode consistir de psicoterapia, grupos de autoajuda, terapia familiar e em alguns casos, o uso de medicação. Os grupos de autoajuda para familiares de dependentes, tais como Alanom e Codependentes Anônimos são de grande utilidade no processo de recuperação familiar da codependência. A codependência tem recuperação. É possível mudar.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os padrões presentes nos dependentes químicos se estendem ao sistema familiar, estabelecendo condutas e comportamentos repetitivos que promovem o ciclo de dependência e que podem agravar a situação do dependente. Assim, o apoio da família começa por ela assumir suas dificuldades e mudar os padrões de dependência, pois existem fatores no funcionamento familiar que promovem ou favorecem o processo de dependência.
Na recusa do dependente químico se tratar, sua família poderá dar o primeiro passo, buscando ajuda especializada. Desta forma, os familiares se tornam, antes de tudo, um exemplo para o dependente e, o mais importante, demonstram e assumem que estão dispostos a participar ativamente deste processo no qual todos estão implicados.
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