O espírito natalino começou no hemisfério Norte. Jesus Cristo nasceu numa gruta porque era muito frio e a tradição se criou em ambiente de inverno – as comidas gordurosas da festa geram energia para lidar com as baixas temperaturas, o metabolismo das pessoas nestas condições é de hibernação.
Aqui no hemisfério Sul, no entanto, o clima é inverso. Quanto mais sol, mais funcionamento metabólico, menos sono, mais atividade do intestino, coração e pulmão. Esse momento aconchegante sofre a influência do verão, com euforia e movimentação, porque o calor é biologicamente estimulante: somos mais excitados ao invés de mais serenos. As pessoas procuram festas na rua, há maior movimentação de veículos, maior risco de acidentes pelo uso inadequado de álcool, mais agressividade, e volúpia para comprar tudo de uma vez no fim do ano com o 13o salário.
Recomendo cuidados básicos com a saúde, para viver a tradição natalina respeitando o ambiente em que vivemos: evite excessos alcoólicos; leve a sério a direção segura, sem álcool; mantenha-se bem hidratado; procure se alimentar com comidas leves, evitando as gordurosas, que devem ser apenas degustadas nas festas; diminua o tempo de exposição ao sol.
Mas o principal mesmo é conservar a ideia de harmonia na reunião familiar. Na medida em que os anos vão se passando, o natural é que menos familiares estejam presentes à festa, aguçando a saudade. Os mais velhos passam a ser ‘presenças ausentes’. A boa estratégia para driblar a tristeza é festejar os mais novos, o futuro, a esperança. O foco deve ser nas crianças e não no mais rico e mais poderoso. Como os reis magos presentearam o menino Jesus, são as crianças que mais devem ganhar o que precisam e desejam.
Alguns adultos, por passarem momento mais difícil, com perdas, desemprego, doenças ou separações, nessas festas procuram tomar o álcool com o objetivo de não pensar nos problemas, o que torna o uso mais perigoso, porque não é possível enganar os pensamentos se não houver consumo mais exagerado. A pessoa vai se intoxicar com o álcool com o objetivo de pensar menos, vai ter uma embriaguez, que geralmente se transforma em comportamento descontrolado, seja com a perda da consciência, seja permitindo que todo o mal estar saia de uma só vez, através de comportamento agressivo ou deprimido. E isso pode estragar a festa. Quando usada como elemento gastronômico, uma dose de bebida alcoólica adicionada a um momento feliz, geralmente acompanhada por um prato, não causa mal. É o álcool bom.
Evitar que os ânimos se alterem nessas reuniões portanto deve ser prioridade de todos. Tivemos recentemente um período de luta política e essa luta, por questões históricas e o meio utilizado (redes sociais), se tornou uma briga. Devemos evitar novos confrontos e já podemos preparar o terreno, lembrando de mandar mensagem formal de boas festas para as pessoas com quem brigamos. Podemos substituir mensagens hostis por mensagens cordiais, aproveitando o espírito de Natal que facilita a recepção. É possível que a primeira mensagem não surta efeito, mas já vai quebrar o distanciamento, acenando para um ano novo com menos ressentimento.
No dia de Natal, é sempre bom fazer um levantamento de gratidão, lembrando do que nos foi doado, do que que nos trouxe algum bem, mesmo que a pessoa que o fez não tenha tido esse objetivo. A gratidão ajuda a viver dias mais felizes.
Pessoalmente, há muitos anos eu encaro o Natal com a esperança de que não haja uma catástrofe. Não precisa ser espetacular. Tomo todas as medidas para evitar que seja uma desgraça. E a vida continua. Com esperança.