fonte: Diário do Rio
por Jorge Jaber
Analisar a trajetória das sociedades ao longo dos séculos é um exercício ao mesmo tempo fascinante e educativo. Por que algumas atingiram níveis tão altos de desenvolvimento – não somente material, mas principalmente nos índices de bem estar coletivo –, enquanto outras ainda patinam na pobreza, desigualdade e discórdia? Há, claro, um sem-número de explicações para a questão, baseadas em fatores históricos, econômicos e até climáticos, entre outros, mas há uma característica comum naquelas com maior qualidade de vida: a capacidade de antever, discutir e enfrentar sem medo os desafios.
Em determinadas situações, os brasileiros já se mostraram aptos para essa tarefa, promovendo, por exemplo, debates profundos sobre o tabagismo e o consumo de álcool ao volante, que resultaram tanto num conjunto rigoroso de leis quanto no despertar da consciência de boa parte da população sobre esses temas – o que talvez seja ainda mais relevante. Se hoje em dia dirigir sob efeito de drogas ou bebida e fumar em ambientes públicos fechados são comportamentos reprováveis, passíveis até de punição legal, isso é fruto de um grande esclarecimento e apoio da sociedade em relação ao assunto.
Somos, portanto, capazes de atingir resultados positivos através da troca de ideias. Conseguimos, por exemplo, reduzir os índices de tabagismo no país, num trabalho reconhecido até pela Organização Mundial da Saúde, e a Lei Seca vem ajudando a diminuir os danos da verdadeira selvageria que ainda impera no trânsito do país. Infelizmente, esse poder de união em torno de temas relevantes vem sendo sufocado pelo clima de polarização que há longos anos nos domina, impedindo uma discussão produtiva sobre nossos muitos e urgentes problemas. Um deles, a saúde mental.
Uma pena. Segundo a OMS, cerca de 20% de nossa população convivem com distúrbios como depressão, transtornos do humor e, principalmente, ansiedade, que atinge, de acordo com as pesquisas mais recentes, quase 10% dos brasileiros – o maior índice do mundo. O uso excessivo de álcool e outras substâncias psicoativas, também considerado uma enfermidade, é outra fonte de preocupação: estudo da Fundação Oswaldo Cruz mostra que mais de 3,5 milhões de brasileiros são considerados dependentes químicos. Dados, entre tantos outros, que jogam luz sobre o tamanho do problema.
O cenário atual já é preocupante, e não há sinais de melhora a vista. Pelo contrário: as causas desse abalo emocional do país – sociedade polarizada, cotidiano desgastante, dificuldades financeiras, mudanças no mercado de trabalho, violência e insegurança sobre o futuro, entre outras – continuam presentes, assim como seus impactos, que merecem uma coluna à parte. É preciso, portanto, encarar com urgência a questão, num debate que envolva governos de todas as esferas, profissionais de saúde e sociedade civil. O desafio está à frente, e fugir deles nunca foi uma boa estratégia.