fonte: Vida & Ação
Não é só o abismo social que separa jovens de periferias dos que vivem em bairros luxuosos. Os primeiros estão cada vez mais propensos a consumir drogas. E correm risco de sofrer mais de transtornos mentais. Um jovem que mora em um condomínio na Barra da Tijuca, por exemplo, é menos exposto a problemas como transtorno de estresse pós-traumático do que os que moram em comunidades carentes e vulneráveis, enfrentando confrontos armados constantes. É o que revela o psiquiatra Jorge Jaber, que participa esta semana da Jornada Nacional de Patologia Dual, de 19 a 21 de abril, realizada em Madri, na Espanha.
Dos 1.832 pacientes internados entre 2012 e 2016 em sua clínica psiquiátrica do Rio de Janeiro, 494 apresentaram diagnóstico duplo, ou seja, quando há a associação entre transtorno do uso de substâncias psicoativas e outro diagnóstico psiquiátrico concomitante. É o que se chama na Psiquiatria de “patologia dual”, um mal que tem atingido cada vez mais quem sofre de dependência química. Segundo a Sociedade Espanhola de Patologia Dual, dois terços dos dependentes químicos sofrem de outra doença mental e esta descoberta mudou o tratamento psiquiátrico dos que abusam de drogas.
Falta de cuidados básicos pode gerar doenças psiquiátricas
Para o médico brasileiro pós-graduado em dependência química em Harvard, a grande influência negativa do uso de drogas se refere à população de baixa renda. Segundo ele, quanto mais favorecido economicamente, maior a proteção dos efeitos negativos do uso de drogas e de doenças psiquiátricas. Jorge Jaber afirma que, da mesma maneira que a falta de alimentação pode conduzir a doenças como anemia e a desnutrição, a falta de cuidados médicos básicos para a juventude também pode se manifestar como doenças psiquiátricas de maneira geral.
“A falta de infraestrutura, que seria dever do Estado, impulsiona o aparecimento de doenças psiquiátricas, enquadrando aí os transtornos no uso de drogas. Assim, sem prevenção, o uso cada vez maior de substâncias químicas traz a oportunidade de manifestação de doenças psiquiátricas e secundárias ao uso de drogas”, explica o especialista. Ele ainda esclarece que o registro desse aumento fez surgir a união das duas patologias.
“Temos visto na prática que está se tornando mais comum a ocorrência de duas doenças juntas, o que encarece o tratamento de usuários de substâncias químicas. É muito importante a prevenção intensa para evitar que uma ou outra ou as duas se apresentem. O que era um problema ligado ao uso de uma substância, por exemplo a maconha, agora é visto como problema duplo, com depressão, ansiedade ou transtorno psicótico associados” (Jorge Jaber – psiquiatra)
Atividades físicas ajudam na recuperação
Durante o evento em Madri, Jaber explica como uma equipe multidisciplinar e atividades físicas regulares têm ajudado a parcela de pacientes que se enquadram neste caso entre os mais de 100 que tem hoje internados em sua clínica. “Agora desenvolvemos tratamento amplo com equipe multidisciplinar que cuide da saúde mental com medicamentos e terapias, mas também através das artes, cinema, teatro, artes visuais, música, e atividades físicas diversas, para introduzir na juventude opções que tragam satisfação imediata ao jovem, combatendo assim a tendência a procurar prazeres alternativos nas drogas”, resume.
“A partir do resultado podemos observar a que a prática de exercícios físicos regulares proporcionou benefícios relacionados a melhora global da saúde, aumento do bem-estar e autodeterminação, configurando-se como fator relevante na maior adesão ao tratamento em pacientes com diagnóstico dual em ambiente hospitalar psiquiátrico”, conclui Jaber.
Pesquisas revelam benefícios em pacientes dual
Levantamento entre 45 pacientes com idade média de 35 anos entre janeiro de 2016 e fevereiro de 2017 na Clínica Jorge Jaber mostra que 62% consideram a prática de exercícios físicos fundamental para o tratamento, enquanto 20,8% veem com importância e 11,4% são indiferentes. Apenas 1,9% acredita que a prática contribui muito pouco.
Quanto ao bem-estar e autodeterminação, 58,5% consideraram que a atividade física durante a internação foi fundamental para o tratamento. Outros 20% acreditam que contribui bastante (20%), 9,4% acham que a contribuição é pouca e para 7,5% não contribui em nada. Apenas 3,8% se manifestaram indiferentes ao bem-estar e autodeterminação.
A maioria (71,7%) dos pacientes com diagnóstico dual consideraram que a atividade física é o principal fator para maior adesão ao tratamento da dependência química.