fonte: NewMag

Em show recente na Alemanha, o cantor inglês Robbie Williams revelou que sua mãe, Janet, de 84 anos, já não o reconhece mais e às vezes sequer sabe onde está, devido à piora em seu quadro de demência, diagnosticado no final do ano passado. O artista falou também sobre o pai, Peter, de 81, que praticamente já não sai de casa – e, claro, não o acompanha mais no palco – por conta do Parkinson, que enfrenta desde 2017. As declarações, naturalmente, tiveram repercussão mundial, jogando o foco sobre essas doenças e seus impactos, tanto nos enfermos quanto nas pessoas próximas.

Este foi, inclusive, o tema de outra parte de sua fala: a dificuldade de ver pessoas queridas perdendo a capacidade física e cognitiva, uma situação que descreveu como um “drama familiar” para o qual estaria despreparado. “É muito estranho ser adulto nessa fase”, completou. Vindo de uma estrela da música internacional – ou seja, provavelmente sem maiores problemas para proporcionar aos pais o que há de melhor para a saúde – o desabafo mostra o quanto pode ser doloroso acompanhar a velhice e o adoecimento daqueles que amamos. Um processo para o qual precisamos nos preparar.

Ter um parente próximo com doenças degenerativas como demência e Parkinson representa, em primeiro lugar, um enorme fardo emocional. Há uma espécie de luto antecipado, principalmente no caso da demência, pois vemos que estamos perdendo o doente em vida. O sentimento de culpa por não nos dedicar como gostaríamos – ou achamos que deveríamos – a ele também é comum, e também surge quando perdemos a paciência, o que não é raro. Por fim, além da tristeza pela progressão dos sintomas, vivemos em estado de ansiedade pelo medo do futuro.

Nesse cenário, episódios de burnout e depressão ocorrem com alguma frequência, principalmente entre os filhos diretamente responsáveis pelo cuidado com os pais, em especial quando não existe uma rede de apoio. Os relacionamentos interpessoais também sofrem abalos: irmãos entram em conflito sobre quem ou como cuidar, casais se distanciam pela falta de tempo ou cansaço, o isolamento social desfaz amizades… tudo isso em meio ao desequilíbrio financeiro provocado pelo alto custo de remédios, profissionais e adaptações domésticas, entre outros.

Não é, como vemos, uma situação confortável, e estamos todos sujeitos a ela. O melhor, portanto, é prevenir. Essas doenças não têm cura, mas há formas de retardar sua manifestação e avanço, minimizar os sintomas e melhorar a qualidade de vida dos enfermos e, consequentemente, dos próprios cuidadores. Atividade física regular, alimentação saudável, sono de qualidade, estímulo cognitivo – leitura, cursos, palavras cruzadas – e interação social frequente, mantendo contato com amigos e parentes, são fatores que podem postergar o surgimento dessas e outras enfermidades.

Manter sob controle o risco cardiovascular também ajuda: hipertensão, diabetes e colesterol alto aumentam o risco de demência, como tabaco, álcool e drogas, que, além do fígado, pulmões e coração, comprometem diretamente o sistema nervoso central. Como as doenças degenerativas têm componente hereditário, a ocorrência de casos em parentes deve ser relatada ao médico, que pode indicar o acompanhamento genético, com exames, avaliação do histórico familiar e rastreio precoce dos sintomas para tentar impedir ou retardar o surgimento e evolução da enfermidade.

Esses distúrbios, como vimos, podem ser extremamente danosos, mas também podem ser prevenidos e tratados – inclusive gratuitamente, em nosso sempre atuante Sistema Único de Saúde – e a generosidade de Robbie Williams ao expor mais uma vez o problema dos pais é um apoio inestimável neste sentido. Essas doenças são cercadas por preconceito e estigma, e falar sem pudores sobre elas é um dos meios para atenuar seus impactos. Ao cantor, e a todos que enfrentam de alguma maneira essa delicada situação, nosso agradecimento e solidariedade.

Jorge Jaber é psiquiatra e grande benfeitor da Academia Nacional de Medicina.
https://clinicajorgejaber.com.br/novo/

A velhice e o adoecimento