por Dr. Jorge Jaber

No drama da dependência química, encenado diariamente em milhões de lares Brasil afora, o dependente está no centro do palco, mas há um personagem com a trajetória fortemente afetada pela estreita ligação com ele: o codependente. São pais, filhos, parentes ou mesmo amigos íntimos de alcoólatras, dependentes químicos ou até deficientes mentais ou físicos que desenvolvem um padrão doentio de lidar com a vida, numa reação involuntária ao problema da pessoa querida.

Mesmo fora dos holofotes, os codependentes merecem um momento de nossa atenção e reflexão. Influenciados pela doença do “ator principal”, obcecados em controlar seu comportamento, eles perdem a capacidade de administrar a própria vida – e, consequentemente, até mesmo de ajudá-lo em seu tratamento. A codependência, é, ela própria, uma doença, emocional e comportamental, muitas vezes com efeitos físicos como depressão, hipertensão, diabetes e outros. Não é contagiosa, mas contagiante, e progressiva – aumenta quando a dependencia do outro se agrava.

Como no mito de Narciso, em que a ninfa Eco é condenada a repetir eternamente as últimas palavras do interlocutor, os codependentes dão eco, repercutem a doença do outro, às vezes até agravando-a. São considerados ou mesmo acusados de problemáticos, num quadro que necessita de tratamento, às vezes até antes do próprio dependente original.

Pessoas nessa situação desenvolvem um sistema danoso de pensar, sentir e comportar-se em relação a si mesmos e aos demais. Só se sentem úteis ou valorizadas quando se dedicam à doença do outro, resolvendo seus problemas e tolerando seus abusos independente das circunstâncias, pois temem perder seu amor. Inconscientemente ou não, buscam a aprovação alheia, tentando ser vistos como mártires, dedicados integralmente a servir. Agem assim na crença de um ganho secundário, uma recompensa, mas isso pode causar sofrimento e comportamentos e hábitos autodestrutivos.

A codependência se manifesta na dificuldade em nutrir relações saudáveis e de preservar a autonomia e o espaço próprio, além da necessidade obsessiva de controlar o comportamento do outro, expressa em conselhos e cuidados exagerados. Esse quadro leva a um sentimento de frustração e incapacidade, pois o codependente nunca acredita que sua ajuda é suficiente. Os efeitos sobre a autoestima são inevitáveis.

Evidentemente, nem todos que se preocupam e tentam ajudar um dependente químico devem ser considerados codependentes. O exagero nos cuidados e o abandono das próprias necessidades e objetivos, num processo de autoabandono e destruição, é o que caracteriza a enfermidade. É, normalmente, um processo de longo prazo, com perdas emocionais e profissionais e efeitos também no dependente original. A atenção a esses sintomas é fundamental, e a busca por tratamento psicológico – terapia em grupo, familiar ou individual – ou mesmo psiquiátrico, indispensável. Grupos como o Nar-anon e o Al-anon prestam um serviço valioso nesse sentido. É possível mudar, ajudando a si e ao próximo.

A Dependência Química e o codependente